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O reino de Kiato
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terio; mas em uma linguagem crúa, mais crúa que a de Zola na «Terra».

O enredo era conduzido com arte, as scenas vividas, as personagens moviam-se, nós as viamos como vivas. O vigor da expressão, o estudo dos diversos estados d’alma, a descripção das sensações, faziam do livro excellente incentivo, ou antes, optimo manual de perdição. Que differença da escola ingleza! pensava Paterson.

O romance inglez, forte nas descripções, não desnudando chagas que, a bem da moral, devem estar sempre veladas, deleita, moralisa, edifica. Dickens, por exemplo, tem paginas admiraveis de psychologia, paginas descriptivas intensas, mas é artista, que não desce á analyse dos estados pathologicos do espirito.

«A Queda», pathologia de uma alma enferma em todos os seus detalhes, era a repetição das mesmas scenas de adulterio tantas vezes celebradas. Uma mulher que entra na vida mundana, cercada de admiradores de sua rara formosura; que, escudada na virtude, resiste até mais não poder ás seducções; e que, afinal vencida, para se ver livre do marido, mata-o. As peripecias, descriptas com tal maestria, tornavam-no optima lição de adulterio.

Para a arte não ha immoralidade; mas o artista deve ter pudor, não deve cultivar o «feio» de preferencia ao «bello», e nunca o obsceno. Zola por exemplo, em alguns de seus livros, moralisa escadalisando. Para mais realçar a belleza de um membro são, apresenta primeiro a fealdade repellente de um membro gangrenado. Descreve a enfermidade sem escolher termos, indo ás vezes até á obscenidade.

Paterson voltou na noite seguinte á bibliotheca; a