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Página:O Saci (8ª edição).pdf/15

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MONTEIRO LOBATO

a caçarola no fogo e vim para este canto picar fumo p'r'o pito. Nisto ouvi no terreiro um barulhinho que não me engana. “Vai ver que é saci!” pensei comigo. E era mesmo. Dali a pouco um saci preto que nem carvão, de carapuça vermelha e pitinho na boca, apareceu na janela. Eu imediatamente me encolhi no meu canto e fingi que estava dormindo. Ele espiou de um lado e de outro e por fim pulou para dentro. Veio vindo, chegou pertinho de mim, escutou os meus roncos e convenceu-se de que eu estava mesmo dormindo. Então começou a reinar na casa. Remexeu tudo, que nem mulher velha, sempre farejando o ar com o seu narizinho muito aceso. Nisto o milho começou a chiar na caçarola e ele dirigiu-se para o fogão. Ficou de cocre no cabo da caçarola, fazendo micagens. Estava “rezando” o milho, como se diz. E adeus, pipoca! Cada grão que o saci reza, não rebenta mais, vira piruá.

Dali saiu p'ra bulir numa ninhada de ovos que a minha carijó calçuda estava chocando num balaio velho, naquele canto. A pobre galinha quasi que morreu de susto. Fez cró, cró, cró... e voou do ninho feito uma louca, mais arrepiada que um ouriço-cacheiro. Resultado: o saci rezou os ovos e todos goraram.

Em seguida pôs-se a procurar o meu pito de barro. Achou o pito naquela mesa, pôs uma brasinha dentro e pac, pac, pac... tirou justamente sete fumaçadas. O saci gosta muito do numero sete.

Eu disse cá comigo: “Deixe estar, coisaruinzinho, que eu ainda apronto uma boa para você. Você ha-de voltar outro dia e eu te curo”.

E assim aconteceu. Depois de muito virar e mexer, o sacizinho foi-se embora e eu fiquei armando o meu plano para quando ele voltasse.