Página:O abolicionismo (1883).djvu/222

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de meio século aberto ainda à propriedade escrava é um absurdo, e nunca foi o pensamento íntimo do legislador. O visconde do Rio Branco, antes de morrer, havia já recolhido como sua recompensa a melhor parte do reconhecimento dos escravos: a gratidão das mães. Esse é um hino à sua memória que a posteridade nacional há de ouvir, desprendendo-se como uma nota suave e límpida do delírio de lágrimas e soluços do vasto coro trágico. Mas, por isso mesmo que o visconde de Rio Branco foi o autor daquela lei, ele seria o primeiro a reconhecer que pela deslocação das forças sociais produzidas há treze anos e pela velocidade ultimamente adquirida, depois do torpor de um decênio, pela ideia abolicionista, a Lei de 1871 já devera ser obsoleta. O que nós fizemos em 1871 foi o que a Espanha fez em 1870; a nossa lei Rio Branco de 28 de setembro daquele ano é a lei Moret espanhola de 4 de julho deste último; mas depois disso a Espanha já teve outra lei – a de 13 de fevereiro de 1880 – que aboliu a escravidão, desde logo nominalmente, convertendo os escravos em patrocinados, mas de fato depois de oito anos decorridos, ao passo que nós estamos ainda na primeira lei.

Pela ação do nosso atual direito o que a escravatura perde por um lado adquire por outro. Ninguém tem a loucura de supor que o Brasil possa guardar a escravidão por mais 20 anos, qualquer que seja a lei; portanto, o serem os ingênuos escravos por 21 anos, e não por toda a vida, não altera o problema que temos diante de nós: a necessidade de