Página:O bobo (1910).djvu/128

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o monge começava a ler alto o pergaminho que tinha nas mãos. A mágoa do Lidador era profunda; porque a sua afeição por Egas fora constante e sincera. Pôs-se a escutá-lo, e, bem como ao velho Fr. Hilarião, as lágrimas lhe rolaram pelas faces.

— "Escrevo-te, Gonçalo Mendes - lia o abade -, nas vésperas talvez de morrer. Deus porventura não quer que meus olhos tornem a ver o lugar onde nasci. Novas são aqui vindas de que Fernando Peres de Trava tem reduzido à condição de vassalo o nobre filho de meu senhor, o conde Henrique. Criei-me com o infante: sei que ele não o sofrerá largo tempo, nem os ricos-homens de Portugal

O sofrerão também. A minha espada pertence àquele de quem a recebi em Zamora: resolvi-me por isso a atravessar os mares. Um recontro com os infiéis me cortou, porém, os passos. Tu, Lidador, acorrerás ao infante melhor que o seu Egas, que é o seu irmão de armas. Cem lanças, entre acostados e homens de tuas honras, podes pôr em seu campo: eu a custo lhe levaria cinquenta. E, além disso, não vale a tua espada dez vezes mais que a minha? Se a guerra for começada sei certo que já estarás com D. Afonso. Um pobre romeiro português me jurou sobre a