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Página:O bobo (1910).djvu/211

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ao infante, e despedaçar nas mãos do ambicioso e altivo barão não só o poder mas a vida. Dom Bibas esteve a ponto de soltar um rugido de contentamento ao ocorrer-lhe essa ideia, e um clarão de danada esperança alumiou as trevas da sua alma.

Desde a morte de D. Henrique, o seu bobo querido caíra da grande altura do valimento ao nível dos animais domésticos; o seu fado fora o dos privados do príncipe que desceu ao túmulo; e, como sucede a estes frequentemente, se não o expulsaram do importante cargo que exercitava, foi que ninguém havia aí que o substituísse. Lançaram-no, porém, para aquele aposento baixo, triste e húmido, em que Dom Bibas desde então habitava, consolando-se do desprezo com essas horas de glória e triunfo, em que imperava, rei das festas nocturnas, nos saraus esplêndidos e nos banquetes sumptuosos, a que ele dava vida e cor com as suas agudezas e chascos.

Nesta espécie de caverna, para onde fora desterrado, o bom do truão curtira muitas horas de tédio: a solidão para qualquer alma sem afectos é um tormento real, e a alma de Dom Bibas era por esse lado uma verdadeira Tebaida. Certo dia em que deitado no seu almadraque tinha os olhos fitos numa réstia de sol