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MONTEIRO LOBATO

O criado, um forte mulato de mysterioso aspecto e mais com ar de automato do que de gente, permaneceu immovel atrás de mim, sem mostras de ter ouvido.

Repeti-lhe a pergunta, e nada. Lembrei-me então da minha conversa com o corretor, quando me deu elle informes sobre o sabio Benson e contou que vivia mysteriosamente, servido por criados mudos. Sem duvida era aquelle um dos taes. Isto fez-me estremecer. O pouco que vira, já me provara não ser o morador do castello um homem commum - e o viver servido por mudos inda mais me aguçava a ponta do enigma.

Prosegui, entretanto, no meu passeio, conformado em fazel-o em silencio, uma vez que era o mutismo a senha da casa.

Em redor do castello estendiam-se campos e florestas. Região montanhosa, mas de relevo suave, coxillas mansas que ao longe ganhavam corpo até se erguerem na morraria de um dos contrafortes da serra do Mar. Nos valles, bellos capões de matta virgem, e, nas lombas, um tapete de gramineas crioulas, naquella epoca revestidas de florinhas roseas.

Notei logo que a natureza não era alli trabalhada. Tudo vivia em estado selvagem, sem sombra de intervenção humana alem da impressa nos caminhos. Nem gado nas pastagens, nem sombras de cultura - porteiras ou cercas. Um pedaço de natureza virgem