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Monteiro Lobato

dóse, sorvendo a mais um martello que fosse, esquentava de cabeça. O quadro da vida antiga vinha-lhe á memoria, o caso da besta, a scena da pancadaria, e Bento, com grande furor, apostrophava os filhos criminosos. Em seguida castigava-os. Corria os ferrolhos das portas e, chispando maldições tremendas, deslombava-os á céga.

Os filhos suportavam o tratamento sem a minima reacção. Mereciam-no e, além disso, era tão gostosa aquella vidinha esmolenga...

Foi por essas alturas que cheguei a Rio Manso, e o caso do Bento, que me interessara á curiosidade desde o primeiro dia, interessou-me depois á piedade.

Resolvi cural-o.

Examinei-o e vi que cegára em virtude de catarata de origem traumatica, sob forma de facil remoção. A faca de de Graefe punha-o bom em tres tempos.

Propuz-lhe o tratamento.

— Deus que o abençôe! Que vontade tenho de ver de novo o sol! O sol, as cores, as gentes... Só quem perdeu a vista sabe o que valem os olhos. Esta noite sem fim...

— Terá fim a tua, meu velho. O caso é