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Página:Obras completas de Luis de Camões II (1843).djvu/319

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Dar em vão tantos gritos: vem; iremos
Ambos a levantar as verdes naças.
  Ambos os anzoes curvos cobriremos
De mentirosas iscas, com que os peixes
A todo prazer nosso prenderemos.
  Assi d'Amor cruel nunca te queixes,
E dessa formosura as mais formosas
Nymphas do mar azul vencidas deixes;
  Que venhas (pois por ti com saudosas
Lagrimas vou gastando a vida e alma)
A tirar-me esperanças duvidosas.
  A praia está callada, o mar em calma;
Por cima desta rocha brandamente
Zephyro respirando a desencalma.
  Aqui não sinto cousa certamente
Porque deixes de vir, como sohías,
Senão, que não es tu disso contente.
  Se desgostas das grossas pescarias,
Marisco appetitoso aqui não falta,
Ja sejão luas cheias, ja vazias.
  Polos pés desta rocha dura e alta
Irei eu despegando huns como pés
D'hum pequeno animal, que nella salta.
  E vivos te darei (se delles es
Amiga) mil cangrejos vagarosos,
Que verás ir andando de revés.
  Não te darei ouriços espinhosos,
Porque te quero tanto, que receio
Qu'esses teus dedos piquem tão mimosos.
  Faz d'aqui perto o mar hum largo seio,
Onde de ameijoas lisas, sem trabalho,{246}