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tua. Bem vezes t’o hei dito — na hora senão alegre ao menos de esperança t’o disse — agora, na hora senão triste, ao menos na hora da solidão, eu t’o repito.

Versos, Luiz! pedes-me versos meus! Pudéra-t’ os eu dar para ler, se aqui estivesses, até enjoar-te; mas nem eu os leio — truncados em meio, sem fim ás vezes, nascêrão-me elles, como esses sentimentos d’alma que um importuno quebra, como um desses sonhos doirados que em meio se apagão. Para mim alli ha uma traducção, embora infiel, um reflexo, embora embaciado, do que se me passa aqui no fundo d’alma; para os outros, para ti mesmo que eu não classifico entre os outros, talvez nada lá haja — talvez os aches frios e seccos, quando ao escrevel-os nem sabes quanta quente lagrima orvalhou-me o papel! Perguntas-me porque não te deixei meus versos. Dir-t’ o-hei. Não foi falta de confiança em ti — longe de mim, longe de ti tal idéa. — Mas tu vês, Luiz, aqui nesta minha solidão, neste exilio de tudo quanto de caro para mim vive ahi nesse mundo, so elles me restão — nelles acho eu muita recordação doce, muita lembrança de muita scismada ventura. Acontece ás vezes que depois de lel-os eu os atiro, ás vezes rasgo-os, mas ao menos antes me

havião elles concedido sonhar — e ás vezes ao lel-os uma lagrima fresca me corrêra do mar de dôr que me alaga o cerebro.

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