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ORIGEM DAS ESPÉCIES

pode responder que os mamíferos não têm podido emigrar, enquanto que certas plantas, graças à diversidade dos seus meios de disseminação, puderam ser transportadas passo a passo através de espaços imensos. A influência considerável das variadas barreiras é apenas compreensivel tanto quanto a grande maioria das espécies foi produzida de um lado, e não pôde passar ao lado oposto. Algumas famílias, muitas subfamílias, um grande número de géneros, estão limitados numa região única, e muitos naturalistas observaram que os géneros mais naturais, isto é, aqueles de que as espécies se aproximam mais entre si, são geralmente próprios a uma só região assaz restrita, ou, se têm uma vasta extensão, esta extensão é contínua. Não seria uma estranha anomalia que, descendo um grau abaixo na série, isto é, até aos indivíduos da mesma espécie, prevalecesse uma regra completamente oposta, e que estes não tivessem, pelo menos na origem, sido limitados em qualquer região única?

Parece-me, pois, muito mais provável, como de resto a muitos outros naturalistas, que a espécie se produziu num só país, de onde em seguida se espalhou tão longe quanto lhe permitiram os meios de emigração e de subsistência, tanto nas condições da vida passada como nas condições da vida actual. Apresentam-se, sem dúvida, muitos casos em que é impossível explicar a passagem de uma mesma espécie de um ponto a outro, mas as alterações geográficas e climatéricas que se realizaram certamente desde as épocas geológicas recentes, devem ter rompido a continuidade da distribuição primitiva de muitas espécies. Estamos, pois, reduzidos a apreciar se as excepções na continuidade de distribuição são bastante numerosas e bastante graves para nos fazer renunciar à hipótese, apoiada por tantas considerações gerais, de cada espécie ser produzida num ponto, e partindo daí se espalhou para tão longe quanto é possível. Seria fastidioso discutir todos os casos excepcionais em que a mesma espécie vive actualmente em pontos isolados e afastados, e demais não teria eu a pretensão de encontrar uma explicação completa. Todavia, após algumas considerações preliminares, discutirei alguns dos exemplos mais nítidos, tais como a existência da mesma espécie nos cumes de montanhas muito afastadas e sobre pontos muito distantes das regiões árcticas e antárcticas; em segundo lugar (no capítulo seguinte), a notável extensão das formas aquáticas de água doce; e, em terceiro lugar, a existência das mesmas espécies terrestres nas ilhas e nos continentes mais vizinhos, se bem que por vezes separados por muitas centenas de milhas de mar. Se a existência da mesma espécie em pontos distantes e isolados da superfície do