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DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA
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globo pode, num grande número de casos, explicar-se pela hipótese de cada espécie ter emigrado do seu centro de produção, então, considerando a nossa ignorância no que é concernente, tanto às alterações climatéricas e geográficas que se realizaram outrora, como aos meios acidentais de transporte que puderam concorrer para esta disseminação, creio eu que a hipótese de um berço único é incontestàvelmente a mais natural.

A discussão deste assunto permitir-nos-á ao mesmo tempo estudar um ponto igualmente muito importante para nós, isto é, se as diversas espécies do mesmo género que, segundo a minha teoria, devem todas derivar de uma origem comum, podem ter emigrado do país por estar habitado modificando-se durante a sua emigração. Se se pode demonstrar que, quando a maior parte das espécies habitando uma região são diferentes das de outra região, estando contudo muito vizinhas, houve outrora emigrações prováveis de uma destas regiões para outra, estes factos confirmarão a minha teoria, porque se podem explicar fàcilmente pela hipótese da descendência com modificações. Uma ilha vulcânica, por exemplo, formada por levantamento a algumas centenas de milhas de um continente, receberá provavelmente, em curto prazo, um pequeno número de colonos, de que os descendentes, ainda que modificados, estarão, contudo, em íntima relação de hereditariedade com os habitantes do continente. Semelhantes casos são comuns, e, assim como veremos mais tarde, são completamente inexplicáveis na hipótese das criações independentes. Esta opinião sobre as relações que existem entre as espécies de duas regiões aproxima-se muito da emitida por M. Wallace, que concluiu que «cada espécie, na sua origem, coincide pelo tempo e pelo lugar com outra espécie preexistente e de perto aliada». Sabe-se actualmente que M. Wallace atribui esta coincidência à descendência com modificações.

A questão da unidade ou pluralidade dos centros de criação difere de uma outra questão que, contudo, se aproxima muito: todos os indivíduos de uma espécie derivam de um só par, ou de um só hermafrodita, ou, como admitem alguns autores, de muitos indivíduos simultâneamente criados? A respeito dos seres organizados que jamais se cruzam, admitindo que os haja, cada espécie deve descender de uma sucessão de variedades modificadas, que são mutuamente suplantadas, mas sem jamais se misturarem com outros indivíduos ou outras variedades da mesma espécie; de maneira que a cada fase sucessiva da modificação todos os indivíduos da mesma variedade derivam de um só pai. Mas, na maioria dos casos, para todos os organismos que se emparelham habitualmente para cada fecundação, ou