Página:Origem das espécies (Lello & Irmão).pdf/408

Wikisource, a biblioteca livre
382
ORIGEM DAS ESPÉCIES

ainda mais quente, tal como o antigo pliocénio, um grande número de plantas e animais semelhantes habitaram a região quase continua que cerca o pólo. Estas plantas e estes animais. devem ter, nos dois mundos, começado a emigrar lentamente para o sul, à medida que a temperatura baixava, muito tempo antes do começo do período glaciário. São, creio eu, os seus descendentes, modificados por toda a parte, que ocupam agora as porções centrais da Europa e dos Estados Unidos. Esta hipótese permite-nos compreender o parentesco, aliás muito afastado da identidade, que existe entre as produções da Europa e as dos Estados Unidos; parentesco muito notável, vista a distância que existe entre os dois continentes, e a separação por um oceano tão considerável como o Atlântico. Compreendemos igualmente este facto singular, notado por muitos observadores, que as produções dos Estados Unidos e as da Europa eram mais vizinhas entre si durante os últimos estádios da época terciária do que o são hoje. Com efeito, durante estes períodos mais quentes, as partes setentrionais do velho e do novo mundo deviam ter sido quase completamente reunidas por terras que serviram de verdadeiras pontes, permitindo as migrações recíprocas dos seus habitantes, pontes que o frio interceptou em seguida totalmente.

O calor decrescendo lentamente durante o período pliocénio, as espécies comuns ao velho e ao novo mundo deviam ter emigrado para o sul; desde que passaram os limites do círculo polar, toda a comunicação entre elas foi interceptada, e esta separação, sobretudo no que diz respeito às produções correspondentes a um clima mais temperado, devia realizar-se numa época mais remota. Descendo para o sul, devem as plantas e os animais, numa destas regiões, ter-se misturado com as produções indígenas da América, e entrar em concorrência com elas, e, numa outra grande região, com as produções do velho mundo. Encontramos, pois, aí todas as condições requeridas para modificações bem mais consideráveis que para as produções alpinas, que ficaram, desde uma época mais recente, isoladas pelas diversas cadeias de montanhas e nas regiões árcticas da Europa e da América do Norte. Resulta que, quando comparamos umas com outras as produções actuais das regiões temperadas do velho e do novo mundo, encontramos muito poucas espécies idênticas, se bem que Asa Gray tenha recentemente demonstrado que há muitas mais do que se supunha outrora; mas, ao mesmo tempo, encontramos, em todas as grandes classes, um número considerável de formas que alguns naturalistas julgam como raças geográficas, e outros como espécies distintas; encontramos, enfim, um conjunto de formas estreitamente aliadas ou repre-