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Página:Os Maias - Volume 1.djvu/388

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OS MAIAS

merecia uma bala no coração! Mas ella tambem, deixar-se tocar, não ter fugido, consentir ainda depois em dormir com elle!.. Tudo uma corja!

— ­E a sr.ª Adelia, perguntava Craft, não tem idéa de como elle descobriu?..

— ­Isso é que é prodigioso! gritou Ega, apertando as mãos na cabeça.

Sim, prodigioso! Não fôra carta apanhada: elles não se escreviam. Não podia ter surprehendido as visitas á Villa Balzac: as cousas estavam combinadas com uma arte muito subtil, perfeitamente impenetraveis. Para vir ali, nunca ella commettera a indiscripção de se servir da sua carruagem. Nunca ella claramente entrara pela porta. Os criados d’elle nunca a tinham visto, não sabiam quem era a senhora que o visitava... Tantos cuidados, e tudo estragado!

— ­Estranho, estranho! murmurava Craft.

Houve um silencio. A sr.ª Adelia terminara por descançar familiarmente n’uma cadeira, com a sua trouxasinha no regaço.

— ­Pois olhe, sr. Ega, disse ella, depois de reflectir, creia então uma cousa, é que foi em sonhos. Já tem acontecido... Foi a senhora que sonhou alto com v. ex.ª, disse tudo, o sr. Cohen ouviu, ficou de pedra no sapato, espreitou-a, e descobriu a marosca... E eu sei que ella sonha alto.

Ega, diante da sr.ª Adelia, percorria-a desde as flôres do chapéo até á roda das saias, com os olhos faiscantes.

— ­Como é possivel que elle ouvisse? Se elles tinham quartos separados!... Eu sei que tinham.