Página:Os descobrimentos portuguezes e os de Colombo.djvu/114

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o despeito de um desprezado, ou a vingança de um vencido.

Era por acaso o infante D. Henrique um impeccavel? Mais ainda: era um vulto sympathico, affectuoso, altruista, um d’estes entes divinaes como o Christo, cuja doce bondade irradia na Historia, que nos captiva quando lêmos a sua Vida como devia captivar os que no seu tempo viveram, debaixo do influxo magnetico da sua meiguice, da sua amoravel candura? Não, de certo, e nem é esse infelizmente o caracteristico dos homens a quem se devem os grandes emprehendimentos. É terrivel o homem unius libri, diz o pensador antigo. Não o é menos o homem de um só pensamento e de uma só ambição. Bondoso, quando se trata de attrahir os outros, de os enfeitiçar e de os fazer escravos da sua idéa e instrumentos do seu plano; absolutamente despido de toda a caridade e de todo o affecto quando o instrumento deixa de servir, e quando o escravo pede em paga uma pouca de dedicação e um pouco de sacrificio. Um dos homens mais captivadores que tem havido foi Napoleão. Prendia, subjugava com o encanto da sua apparente bondade, inspirava dedicações fanaticas, mas nunca foi bom para os outros, nunca pensou na felicidade alheia. Entregue exclusivamente ao seu pensamento ambicioso, á grandeza da sua idéa gigante, absorvia-se todo n’ella, bastante habil para se não esquecer de captar aquelles