que se não confundem n’um só Paraizo aquelle de que o homem foi expulso, e o outro em que o homem ha de entrar, quando lhe franquear a entrada o guarda a quem o confiaram Christo e o discipulo amado.
Essa lenda vaga, ou antes essa incerta aspiração, concretisou-se n’uma d’essas obras anonymas em que o sentimento popular se manifesta, em que os devaneios da sua alma são encorpados, desenvolvidos e ordenados por um trovador ignorado, por um narrador mysterioso, que é afinal de contas quem produz verdadeiramente a obra popular, que depois muitas vezes um grande poeta aproveita para uma obra immortal. Assim se formou a lenda do Prestes João com o seu reino de maravilhas, a do Judeu errante, a do dr. Fausto, a de D. João Tenorio, e a de mil outros, que não tiveram outro berço senão a redacção humilde e vulgar de um pobre sonhador ignorado, que desapparece entre o povo, a quem se attribue a gloria da concepção, e a obra do grande poeta que deu á lenda a fórma definitiva e litteraria que a tornou immortal. O modo como esta lenda se formulou foi na redacção de uma carta dirigida pelo Prestes João ao imperador de Roma e ao rei de França e em que lhes contava as maravilhas do seu reino, onde os homens viviam annos quasi infinitos, onde havia maravilhosas riquezas, onde os animaes e as plantas tinham um tamanho descommunal, e