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Página:Os trabalhadores do mar.djvu/344

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grande Douvre, polida, unida, lisa, perpendicular, e feita como por desenho, era de um só jacto e parecia feita de marfim preto. Nem um buraquinho, nem um relevo. Trepar por ella era impossivel: não podia servir nem á fuga de um criminoso, nem ao ninho de um passaro. No cume havia como no rochedo Homem, uma plata-fórma; era porém inaccessivel.

Podia-se trepar pela pequena Douvre, mas não ficar lá, podia-se ficar na grande Douvre, mas não se podia subir.

Gilliatt, depois de lançar os olhos por tudo aquillo voltou á pança, descarregou-a na mais larga das cornijas á flôr d’agua, fez de todo o carregamento, aliás pequeno, uma especie de pacote, atou-o n’um panno alcatroado, depois içou-o por meio de um cabo até um ponto da rocha onde o mar não podia chegar; feito isto, abraçou-se á pequena Douvre, e com pés e mãos, de fenda em fenda, trepou por ella até a Durande que estava no ar.

Chegando a altura das caixas das rodas saltou dentro.

O interior do navio era lugubre.

A Durande apresentava todos os vestigios de um arrombamento medonho. Era a violação tremenda da tempestade. A tempestade comporta-se como um pirata. Nada assemelha-se mais a um attentado que um naufragio. Nuvens, trovão, chuva, vagas, tufões, rochedos, horrivel multidão de cumplices é esta.

No meio daquelles destroços, pensava-se em alguma cousa semelhante ao tripudio furioso dos espiritos