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PETER PAN

— Havia uma razão muito importante. Tendo cada qual a sua arvore, um não atrapalhava o outro, quando eram atacados pelos piratas ou pelos lobos famintos. Sumiam-se todos a um tempo, cada qual pela sua entrada. Se não fosse assim, na precipitação da fuga dois ou tres eram capazes de se meterem pelo mesmo oco, ficando entalados lá dentro. Não ha melhor defesa contra piratas e lobos do que arvores ôcas, que vão dar em cavernas subterraneas. Tomem nota disso.

Pedrinho tomou nota em seu caderno.

— Na noite em que começa esta historia, prosseguiu dona Benta, estavam os meninos perdidos a brincar na floresta. vestidos de pele por causa do grande frio. Um deles dansava uma valsa com um avestruz. De longe mais pareciam ursinhos do que gente.

— E quantos eram?

— Seis. O mais velho chamava-se Levemente-Estragado. Os outros chamavam-se Bicudo, Cachimbo, Assobio e, finalmente, Gemeo. Gemeo era o nome dado a dois meninos realmente gemeos e tão iguaizinhos que as mesmas roupas e o mesmo nome serviam para ambos.

— E como se distinguis um do outro?

— Não se distinguiam. Os demais lidavam com eles como se fosse um só.

— Eu sei, berrou Emilia. Com os livros é assim. Ha montes de livros tão iguais que tanto faz a gente pegar num como pegar noutro. A obra é a mesma.

— Pois é, disse dona Benta rindo-se da comparação da boneca. Os seis meninos perdidos eram esses tais, e naquela noite estiveram brincando até tarde, á espera de Peter Pan, que fora á cidade ouvir o resto da historia da senhora Darling.

— Estiveram brincando de que? perguntou Pedrinho.

— De tudo, respondeu dona Benta. Os meninos ingleses são como vocês aqui; brincam de tudo. E um deles tinha um brinquedo muito original.