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KOSMOS
POR DARWIN
(CONTINUADO DO N. 3 D'ESTE ANNO)
CAPITULO IV
Peculiaridades sexuaes e dimorphismo


O nosso Tanais que, em quasi todos os particulares de sua estructura, é um animal extremamente notavel, forneceu-me um segundo facto digno de menção, relativamente á theoria da origem das especies por selecção natural.

Quando estructuras em forma de mão ou de pinça occorrem nos Crustaceos, estas são em geral, mais fortemente desenvolvidas nos machos do que nas femeas, tornando-se muitas vezes maiores, nos primeiros, até dimensões verdadeiramente desproporcionadas, como já tivemos o ensejo de ver em Melita.

Um exemplo melhor conhecido de taes pinças gigantes, é apresentado pelos machos dos «Thesouras» (Gelasimus) que dizem trazer, na corrida, estas garras «elevadas, tal como se acenassem com ellas» — asserção que, no emtanto, não é verdadeira para todas as especies, tal como uma, pequena e especialmente megachela que eu vi, correndo aos milhares, nos campos de cassava, na foz do Cambriú, conservando sempre as pinças estreitamente comprimidas sobre o corpo.

Uma segunda peculiaridade dos Crustaceos machos, consiste, não raro, em um mais abundante desenvolvimento, sobre o flagello das antennas anteriores, de delicados filamentos que Spence Bate chama de «cilios auditivos»: e, eu considerei serem orgãos olfactivos, como o fez Leydig antes de mim, o que comtudo eu não sabia. Assim, elles formam longos e densos tufos nos machos de muitos Diastylideos, como Van Beneden tambem constata, com respeito á Bodotria, emquanto as femeas sómente os possuem mais escassamente. Nos Copepodes, Claus chamou a attenção sobre a differença dos sexos n'este sentido. Parece-me, como eu posso notar de passagem que, este maior desenvolvimento nos machos, é grandemente favoravel á opinião de Leydig e á minha, visto como em outros casos os machos, não raro, são guiados pelo olfacto, na procura das femeas ciosas.

Agora, no nosso Tanais, os jovens machos proximos á muda ultima de pelle que precede á maturidade sexual, assemelhão-se ás femeas, mas, então, elles soffrem uma importante metamorphose.

Entre outras cousas, perdem os appendices moveis da bocca, mesmo os que servem para manter a corrente respiratoria (fig. 4); o seu intestino é sempre encontrado vasio e, só parecem viver para amar. Porém, o mais notavel é que elles surgem, então, sob duas formas diversas.

Alguns (fig. 3) adquirem chelipedes poderosos, longidactilos e muito moveis e, em vez do unico filamento olfactivo da femea, mostram 12 á 17 d'esses orgãos, os quaes ficam juntos em numero de 2 ou 3, sobre cada articulação do flagello. Outros (fig.5) retêm a forma espessa e curta dos chelipedes das femeas; porém, em compensação, suas antennas (fig. 6) são providas de um numero muitissimo maior de filamentos olfactivos que, se mostram em grupos de cinco a sete.

Em primeiro logar e antes de inquerir da sua significação, eu quero dizer uma palavra mesmo sobre este facto. Seria natural, considerar se duas especies differentes, com as femeas muito semelhantes e os machos muito diversos, não poderiam viver juntos, ou se os machos de uma especie em vez de apparecerem em duas formas frisantemente definidas, não poderiam ser variaveis, senão dentro de limites muito amplos. Não posso admittir nenhuma destas supposi-