Página:Scintillações e sombras.pdf/28

Wikisource, a biblioteca livre
20

Será inconsciente?
— O′ grande monstro, ó mar!
Quem ha ahi tão vão que julgue devassar
Os mysterios que tens n′essas verdes entranhas?

O′ Primavera! tu, que vestes ás montanhas,
Aos cerros, aos jardins, aos oiteiros e aos prados,
Os trajos festivaes, os trajos perfumados,
Urdidos com a flôr das frescas balsaminas,
Da rosa, do jasmim, do lirio e das boninas;
Tu, que tens no teu seio as noites constelladas
E no labio vermelho as brancas madrugadas;
Tu, que trazes no olhar scintillações ardentes,
Como os beijos das mães e as orações dos crentes;
Tu, que és a inspiração das nossas phantasias,
Que ás andorinhas dás um ninho e ás cotovias
Uma argentina voz para saudar a aurora,
Sabes o que é amor, ó fada encantadora?

Esplendoroso sol, que passas no horisonte,
Levando um mar de fogo a salpicar-te a fronte,
Grande fecundador da vasta natureza,
Tu, que nos dás a luz, o calor e a riqueza,
Tu, que fórmas a chuva e que fórmas os ventos,
Que és um grande portento, entre os maiores portentos,
Dize, ó astro gentil, ó astro protector,
Tu pódes comprehender a immensidão do amor?

O′ lua, ó confidente eterna do poeta,
Que vae sob o balcão da timida Julieta
A deshoras chorar apaixonado canto,