Página:Ultimas Paginas (Eça de Queirós, 1912).djvu/33

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dia de Abril, quente e longo. E quase imediatamente se viu sentada, no adro da capela, na aldeia, um domingo de festa, no primeiro dia de maio: em volta as raparigas dançavam, ao som da rabeca que tocava um menestrel; os moços mais fortes lutavam sobre a relva; um servo do castelo vendia vinho de uma grande pipa enfeitada de louro; e um cavaleiro, todo armado, segurava um cavalo de grandes crinas, tão bravo que ninguém o podia montar... E eis que, de repente, o seu filho aparece com um gibão de pano azul, um capuz escarlate como o filho de um mercador, e logo derruba na luta os mais fortes, amansa o corcel indomável, faz empalidecer de amor todas as raparigas só com volver os olhos radiantes, e, tomando a rabeca do menestrel, começa tão divinamente a tanger, que todos os pássaros saíam das ramarias, e vinham maravilhados, pousar nos seus ombros largos. Ela tremia, num infinito orgulho. E em roda todos, erguendo os barretes, gritavam:

— Eis o mais belo, o mais destro, o mais forte! Seja ele o Rei de Maio!

Acordou ao clamor triunfal. O seu homem areava o seu machado. E quando ela, ainda ofegante, lhe contou o seu sonho, ele permaneceu muito tempo pensativo, porque os sonhos são como tapeçarias que os anjos desenrolam e em que estão bordados, em cores claras, os destinos que hão de ser.