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na grande feira de S. João, em Viseu: todos os homens de armas foram providos com lorigas novas, ascumas de largo cutelo, cascos que reluziam como espelhos: – e a armadura de Gil, que a mãe com o dinheiro das suas arras lhe quis dar, era tão bela, que esteve, durante todo um domingo, exposta na capela do solar.

Pêro Malho constantemente acompanhava D. Gil nestas ocupações de cavaleiro. Era ele quem polia as armas, dava a ração ao ginete, cuidava dos galgos favoritos de D. Gil, tudo dispunha para os exercícios de armas: – e mesmo, como a idade e os achaques iam tornando mais trôpego o aio de D. Gil, era Pêro quem dormia, atravessado à porta do seu aposento, e lhe batia as roupas com um junco, e, à mesa, lhe enchia o pichel de vinho. D. Gil começava a ganhar grande afeição a este escudeiro.

Era Pêro um mocetão, mais moreno que um mouro, esperto, destro e destemido, de uma alegria que Lhe trazia sempre descobertos os dentes magníficos, grande sabedor de histórias e rifões, lindo bailador em festas de adro, e tão rijo, que podia passar dois dias de jornada, sem sono, sem ração, bebendo apenas nas fontes um golo de água, pela borda do sombreiro. Sabia tudo quanto compete à caça e à guerra – e D. Gil tanto se ia afeiçoando a este moço, que já decidira levá-lo