Página:Ultimas Paginas (Eça de Queirós, 1912).djvu/73

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já sem medo, reconhecendo o filho do lenhador, se juntavam em torno dele, tocando-lhe com as toucas altas pelo joelho, e erguendo os olhos pasmados para as alturas de sua face.

Obtuso de espírito, ele não reconhecia ninguém – mas sorria sempre. Pouco a pouco, porém, na grande penumbra do seu espírito, decerto surgiram certas memórias dos tempos, que, ainda, pequeno, era o servo da aldeia, e os seus enormes braços moveram-se com lentidão como procurando de novo fardos a levantar, fraquezas a socorrer. E quase imediatamente, vendo uma velha que passava, vergada sob o molho de lenha, tirou-lho e meteu-o, como uma simples acha, sob o braço; depois como um carro de pedra passava, tão pesado que os bois não o podiam puxar, desatrelou o gado, tomou o timão. Mas avistando ainda o moleiro, que picava o seu velho burro carregado de sacos de farinha, com os seus cinco enormes dedos ergueu os fardos do jumento; atirou ainda para os ombros um pobre velho, manco, que mal se arrastava – e assim, com o molho de lenha debaixo do braço, o velho pendurado do pescoço, os sacos pendentes da mão, o pesado carro de pedra preso pelo outro braço, começou a caminhar para a aldeia, seguido das mulheres, que acenavam para o lado, para as portas dos casais, e gritavam” “É Cristóvão! É Cristóvão!”