Página:Viagens na minha terra, v1 (1846).pdf/167

Wikisource, a biblioteca livre
— 153 —


Como e porque deixára elle o mundo? Como e porquê, um espirito tam activo e superior se occupava apenas do obscuro incargo de guardião do seu convento — cargo que acceitára por obediencia — e quasi que limitava as suas relações fóra do claustro áquella casa do valle onde não havia senão aquella velha e aquella criança?

Apezar de sua rigidez ascetica, prendia esse espirito por alguma coisa a este mundo? Aquelle coração macerado do cilicio dos pensamentos austeros e terriveis do eterno futuro, consummido na abstinencia de todo o gôso, detodo o desejo no presente, teria acaso viva ainda bastante alguma fibra que vibrasse com recordações, com saudades, com remorsos do passado?

No seu convento elle não tinha senão uma cella nua com um cruxifixo por todo adôrno, um breviario por unico livro. N’aquella so familia que conversava, havia, ja o disse, a velha cega e decrepita, Joanninha com quem apenas fallava, e um ausente, um rapaz de quem ha dous annos quasi que se não sabia. Em intrigas politicas, em negocios ecclesiasticos, em coisa mais nenhuma d’este mundo não tinha parte. De que