Pensar é preciso/VII/Alternância do real e do ideal

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Alternância do real e do ideal

O Romantismo e o Realismo, além de serem dois momentos históricos opositivos no conjunto da cultura ocidental, representam também duas posturas de contraste perante a visão de vida, ensejando diferentes pedagogias. Já falei, no primeiro capítulo deste trabalho, dos mitos de Apolo, o deus da luz, e Dioniso, o deus do vinho, como representações, respectivamente, da razão e do instinto, do código cultural e do código natural. Na história da evolução humana podemos perceber uma alternância da prevalência ora de um princípio ora de outro.

A teoria dos movimentos literários nos mostra que à época de predominância da cultura greco-romana sucedeu o atraso do longo período medieval. A Renascença retoma o espírito apolíneo da Grécia antiga, especialmente com o Neoclassicismo francês (Corneille, Racine, Molière). Com o Romantismo dá-se a volta ao espírito dionisíaco da Idade Média pela tomada de posição contra o Classicismo generalizante, em favor do caráter nacional da cultura e da prevalência dos interesses do indivíduo sobre o social. O Realismo, que surge em oposição aos ideais românticos, retorna aspectos do Classicismo, valorizando a contribuição das ciências na produção da obra de arte, o papel fundamental da estrutura social para o desenvolvimento civilizacional e a busca da perfeição formal (vejam-se os poetas parnasianos).

Como podemos perceber, um movimento literário surge em oposição ao anterior e retoma aspectos do anterior ao anterior. Mas não se trata de um simples retorno. Cada momento artístico tem variedades de estilo e de significado conforme sua época. Por exemplo, Aristóteles define a arte como imitação da realidade. Tal definição é aceita também pela estética realista. Só que, enquanto na estética clássica a realidade é idealizada, transfigurada pela mão ou pela mente do artista, na época do Realismo a realidade é expressa como ela é e não como gostaríamos que fosse. O mundo da fantasia ou de ideologias cede seu lugar à exposição da verdade existencial exterior e interior, exposta na sua crueldade.