Página:Caramuru 1781.djvu/54

Wikisource, a biblioteca livre


XVIII

"Se dalém das montanhas cá te envia
O grão-Tupá (lhe diz), que em nuvem negra
Escurece com sobra o claro dia,
E manda o claro sol, que o mundo alegra;
Se vens donde o sol dorme e se à Bahia
De alguma nova lei trazes a regra,
Acharás, se gostares, na cabana
Mulheres, caça, peixe e carne humana."

XIX

"- A carne humana! (replicou Diogo,
E como pode, explica em voz e aceno).
Se vir que come algum, botarei fogo,
Farei que inunde em sangue esse terreno;
"- Pois, se os bichos nos devem comer logo,
(O bárbaro lhe opõe com desempeno)
A nós faz-nos horror, se eles nos comem,
E é menos triste que nos trague um homem.

XX

"O corpo humano (disse o herói prudente)
Como o brutal não é: desde que nasce,
É morada do espírito eminente,
Em quem do grão-Tupá se imita a face.
Sepulta-se na terra, qual semente
Que, se não apodrece, não renasce.
Tempo virá, que aos corpos reunida,
Torne a noss'alma a respirar com vida.