Página:Contos Populares Portuguezes colligidos por F. Adolpho Coelho.pdf/99

Wikisource, a biblioteca livre
— 63 —
XXVI


O COLHEREIRO


Houve n'outros tempos um colhereiro que tinha por costume ir a uma mata muito longe da sua casa para apanhar madeira para fazer colheres.

Certo dia que elle estava cortando um pedaço a um castanheiro muito antigo, notou que no tronco havia um grande buraco. Cheio de curiosidade, o colhereiro, quiz ver o que havia dentro, mas mal tinha entrado quando lhe appareceu um mouro encantado; e com voz medonha lhe disse: «Já que te atreveste a penetrar no meu palacio, ordeno-te que me tragas aqui a primeira coisa que te apparecer ao chegares a tua casa, e se não cumprires fica certo que morrerás dentro em tres dias.» Foi-se o colhereiro para sua casa, aonde tinha tres filhas muito lindas, e uma cadellinha que sempre o vinha esperar á entrada da porta.

N'esse dia, porém, contra o seu costume quem lhe appareceu á entrada da porta foi a filha mais velha. Então elle, chorando, contou á filha tudo o que lhe tinha succedido, e pediu-lhe que fosse ella, senão que o mouro o mataria e ficava ella e as irmãs sem amparo.

A filha aprontou-se logo para ir e depois de ter abraçado as irmãs partiu para o palacio do mouro. Deixamos agora o colhereiro com as duas filhas, e vamos ver o que faz o mouro á outra filha. Logo que ella chegou deu-lhe as chaves de todas as salas do palacio, e deitou-lhe ao pescoço um cordão de ouro fino com a chave d'uma sala, prohibindo-a de entrar n'ella, pois se lá fosse morreria. Um dia em que o mouro tinha saido a infeliz rapariga cheia de curiosidade quiz ver o que estava na tal sala, entrou e viu muita gente com as cabeças cortadas; ella, toda horrorisada fechou a porta e poz outra