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Vida e morte de M. J. Gonzaga de Sá (1919)/Explicação necessaria

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EXPLICAÇÃO NECESSARIA


A idéa de escrever esta monographia nasceu-me da leitura diurna e nocturna das biographias do Dr. Pelino Guedes. São biographias de ministros, todas ellas, e eu entendi fazer as dos escribas ministeriaes. Por ora, dou unicamente subsidios para uma; mais tarde, talvez escreva, as duas duzias que planejo.

Não ha neste tentamem nenhuma censura ao illustre biographo, nem tão pouco proposito socialista ou revolucionario de qualquer natureza. Absolutamente não! Obedeci, alias muito inconscientemente em começo, á lei da divisão do trabalho; e, com isso, sem falsa modestia o digo, fiz uma importante descoberta que o mundo me vae agradecer.

Os sabios. pelas noticias que delles tenho, não tinham dado ainda pela falta de verificação desta lei, nos dominios da biographia.

Entretanto, era facil de ver que, exigindo a ordem obscura do mundo humano um doutor que cure, outro que advogue, forçoso era tambem que houvesse um biographo para os ministros e outro para os amanuenses.

Dessa forma, somos, eu e o Dr. Pelino uma bella prova de plena generalidade desse grande asserto scientifico da divisão do trabalho; portanto, longe de ser um capricho, a publicação deste opusculo é manifestação de uma grande e inevitavel lei, a que me curvei e me curvo, como a todas as leis, independentemente da minha vontade.

Crendo-me justificado, dou aqui o testemunho publico de quanto sou grato áquelle escriptor; e se, pelo correr do folheto, puz alguma cousa da minha pessoa, a culpa, afora o meu incorrigivel e elementar egotismo, cabe-me a mim somente que não soube imitar, no estylo, a concisão telegraphica do modelo que adoptei, e, na maneira, a sua superior impersonalidade de relatorio ministerial.

Contudo, não me julgo com a verdade. Deus me livre de tal coisa! Tanto mais que, tendo-me destinado a actividade bem diversa, não me affiz aos estudos que a literatura reclama. Não sei grego nem latim, não li a grammatica do Snr. Candido de Lago, nunca puz uma casaca e não consegui até hoje conversar cinco minutos com um diplomata bem talhado; sigo entretanto, o exemplo do severo e saudoso lente de mechanica da Escola Polytechnica. Dr. Licinio Cardoso, que estudou longos annos a alta mathematica para curar pela homeopathia.

O seu espectaculo foi-me sempre fecundo. As reprovações que levei foram justas: antes de mim, todos os que passaram, sahiam maravilhosamente; depois... oh! então!...

O seu julgamento é um julgamento de Minos, inflexivel e recto, e que tira a sua inflexibilidade da propria ordem do Cosmos; e se, nos actos de, minha vida, alguma vez fui justo, devo-lhe a elle, só e unicamente ao seu exemplo, que tive sempre diante dos olhos, durante a minha adolescencia attribulada.

De joelhos, rendo graças á minha estrella, por ter encontrado na minha carreira, tão raro e modelar exemplo...

Atirando-me aos azares da publicação de um opusculo aliteratado, pode ser que seja feliz, como o meu inestimavel lente e foi na homeopathia; pode ser que não e leve algumas descomposturas. Embora desagradaveis, as descalçadeiras dar-me-ão alento para viver, cousa que me vae faltando dentro de mim mesmo.

E' um estimulante que procuro, e uma imitação que tento. Plutarcho e o Dr. Pelino, mestres ambos no genero, hão de perdoar esse meu plebeu intento, de querer transformar tão excelso genero de litteratuta moral — a bibliographia — em especifico de botica.

Perdoem-me!

Augusto Machado.

8-10-1906.