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"Doida não!" Antes vítima/A sciência do coração

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A sciência do coração
 

 

Aos ilustres clinicos, magistrados,
causidicos e demais funcionários
envolvidos neste drama


 

O célebre escritor francês Jean Maceé, conta esta anedota em um livro muito educativo que se intitula «História de um bocado de pão».

Um poderosíssimo milionário quiz construir um castelo de suntuosidade maravilhosa. Seria a última palavra do conforto, com aquela surpreendente e faustuosa garridice estética de que os orientais possuem o requinte máximo.

A meio da construção deu-se conta de uma grave dificuldade. Não havia água nem possibilidade de obtê-la para o extraordinário consumo da principesca habitação. Apenas uma escassa nascente assegurava um remédio escasso.

Chamados peritos hidráulicos decidiram aproveitar a água dessa nascente, abastecer o palácio, e a mesma água ser de novo filtrada e de novo aproveitada para consumo. Era preciso um modelo de uma bomba que realizasse simultaneamente um movimento de aspiração e de respiração. Era dificil. a empresa.

Foram chamadas legiões de sábios para dar o seu parecer junto dos mais insignes engenheiros. Mas nenhum resolvia o assunto de forma a dar bons resultado. Um dia, já desesperados e desiludidos, abalado o seu prestigio de famosas celebridades, dispunham-se a retirar de vez, humilhados e furiosos.

Surge-lhes entâo uma pequena pobresita e andrajosa, e, estendendo-lhes um embrulho, diz-lhes: «Aqui tendes o modêlo da nova bomba que em vão tentastes construir».

Olharam-se estupefactos.

Era um coração.

 

A historia é simbólica.

Na singeleza da crianca, na sua humildade e no seu instinto inculto, havia mais luz do que em tantas cabeças recheadas de sapiência filosófica. Porque essa luz vinha do coração.

Se luz idêntica iluminasse todas as consciências, todas elas protestariam para que em gesto simultâneo de razão, de bondade e desinteresse, todos os ilustres representantes da magistratura, da advocacia e da medicina, assinassem um termo de humanidade, pondo termo a uma acção de violências e a uma violência de códigos que deixam de ser lustre de uma classe e de uma sociedade para serem espinho de injustiça e traço negro de deshumanidade.

Entremos numa era verdadeiramente crista para sairmos de éras verdadeiramente bárbaras, tomando para base de todos os códigos e código de todas as leis o sentimento preclaro e evangélico do coração.