A Alma do Lázaro/II/XIII
Voltava de ver sumir-se no horizonte o navio que levou-me Luíza.
Cheguei a casa. Pela janela aberta olhei o vulto da cidade a colear pela margem do rio, e disse de mim para mim pensando na gente que a habita:
— Estou só!
E me enganava ainda. Mal tinha murmurado aquelas palavras, veio Maria. Falou, o que raro sucedia. Pela primeira vez, cuido eu, disse uma cousa que se entendesse. A repulsão que eu inspiro, foi-lhe raio de luz, na treva espessa de sua alma.
Pediu-me que a vendesse. Não mais quer servir-me... Tem medo do contágio...
Senhor!... Senhor!... — A Vossa misericórdia é infinita, como a Vossa bondade inexaurível! E não chega para o aflito de mim, nem um óbolo sequer! Vergai-me sob o peso da Vossa cólera, mas dai-me fé e resignação: e eu Vos louvarei, meu Deus, na plenitude da minha dor.
Tenho eu culpa, se me criastes ente de razão? Por que me destes a inteligência? Não a tivera, que esta carne se iria consumindo no roer das úlceras, sem que soltasse uma queixa! Amparai-me, Senhor, amparai-me contra mim mesmo! Tenho medo de descrer!