Codigo Criminal do Imperio do Brazil/Parte Quarta

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Parte Quarta[editar]

Dos Crimes Policiaes.

Capítulo I[editar]

Offensas da Religião, da Moral, e Bons Costumes.

Artigo 276[editar]

Celebrar em casa, ou edificio, que tenha alguma fórma exterior de Templo, ou publicamente em qualquer lugar, o culto de outra Religião, que não seja a do Estado.

Penas - de serem dispersos pelo Juiz de Paz os que estiverem reunidos para o culto; da demolição da fórma exterior; e de multa de dous a doze mil réis, que pagará cada um.

Artigo 277[editar]

Abusar ou zombar de qualquer culto estabelecido no Imperio, por meio de papeis impressos, lithographados, ou gravados, que se distribuirem por mais de quinze pessoas, ou por meio de discursos proferidos em publicas reuniões, ou na occasião, e lugar, em que o culto se prestar.

Penas - de prisão por um a seis mezes, e de multa correspondente á metade do tempo.

Artigo 278[editar]

Propagar por meio de papeis impressos, lithographados, ou gravados, que se distribuirem por mais de quinze pessoas; ou por discursos proferidos em publicas reuniões, doutrinas que directamente destruam as verdades fundamentaes da existencia de Deus, e da immortalidade da alma.

Penas - de prisão por quatro mezes a um anno, e de multa correspondente á metade do tempo.

Artigo 279[editar]

Offender evidentemente a moral publica, em papeis impressos, lithographados, ou gravados, ou em estampas, e pinturas, que se distribuirem por mais de quinze pessoas, e bem assim a respeito destas, que estejam expostas publicamente á venda.

Penas - de prisão por dous a seis mezes, de multa correspondente á metade do tempo, e de perda das estampas, e pinturas, ou na falta dellas, do seu valor.

Artigo 280[editar]

Praticar qualquer acção, que na opinião publica seja considerada como evidentemente offensiva da moral, e bons costumes; sendo em lugar publico.

Penas - de prisão por dez a quarenta dias; e de multa correspondente á metade do tempo.

Artigo 281[editar]

Ter casa publica de tabolagem para jogos, que forem prohibidos pelas posturas das Camaras Municipaes.

Penas - de prisão por quinze a sessenta dias, e de multa correspondente á metade do tempo.

Capítulo II[editar]

Sociedades Secretas.

Artigo 282[editar]

A reunião de mais de dez pessoas em uma casa em certos, e determinados dias, sómente se julgará criminosa, quando fôr para fim, de que se exija segredo dos associados, e quando neste ultimo caso não se communicar em fórma legal ao Juiz de Paz do districto, em que se fizer a reunião.

Penas - de prisão por cinco a quinze dias ao chefe, dono, morador, ou administrador da casa; e pelo dobro, em caso de reincidencia.

Artigo 282[editar]

A communicação ao Juiz de Paz, deverá ser feita com declaração do fim geral da reunião, com o protesto de que se não oppõe á ordem social, dos lugares, e tempo da reunião, e dos nomes dos que dirigirem o governo da sociedade.

Será assignada pelos declarantes, e apresentada no espaço de quinze dias, depois da primeira reunião.

Artigo 283[editar]

Se forem falsas as declarações que se fizerem, e as reuniões tiverem fins oppostos á ordem social, o Juiz de Paz, além de dispersar a sociedade, formará culpa aos associados.

Capítulo III[editar]

Ajuntamentos Illicitos.

Artigo 285[editar]

Julgar-se-ha commettido este crime, reunindo-se tres, ou mais pessoas com a intenção de se ajudarem mutuamente para commetterem algum delicto, ou para privarem illegalmente a alguem do gozo, em exercicio de algum direito, ou dever.

Artigo 286[editar]

Praticar em ajuntamento illicito algum dos actos declarados no artigo antecedente.

Penas - de multa de vinte a duzentos mil réis, além das mais, em que tiver incorrido o réo.

Artigo 287[editar]

Se o ajuntamento illicito tiver por fim impedir a percepção de alguma taxa, direito, contribuição, ou tributo legitimamente imposto; ou a execução de alguma Lei, ou sentença; ou se fôr destinado a soltar algum réo legalmente preso.

Penas - de quarenta a quatrocentos mil réis, além das mais, em que o réo tiver incorrido.

Artigo 288[editar]

Os que se tiverem retirado do ajuntamento illicito, antes de se haver commettido algum acto de violencia, não incorrerão em pena alguma.

Artigo 289[editar]

Quando o Juiz de Paz fôr informado de que exista algum ajuntamento illicito de mais de vinte pessoas, irá com seu Escrivão ao lugar, e achando o ajuntamento illicito, proclamará seu caracter, e alçando uma bandeira verde, admoestará aos reunidos, para que se retirem.

Artigo 290[editar]

Se o Juiz de Paz não fôr obedecido depois de terceira admoestação, poderá empregar força para desfazer o ajuntamento, e reter em custodia os cabeças se lhe parecer necessario.

Artigo 291[editar]

Se no lugar não houver força armada, ou se fôr difficil a sua convocação, poderá o Juiz de Paz convocar as pessoas, que forem necessarias, para desfazer o ajuntamento.

Artigo 292[editar]

Os homens livres de mais de dezoito annos de idade, e menos de cincoenta, que sendo convocados pelo Juiz de Paz, ou de ordem sua, para o fim declarado no artigo antecedente, recusarem, ou deixarem de obedecer, sem motivo justo.

Penas - de multa de dez a sessenta mil réis.

Artigo 293[editar]

Aquelles, que, fazendo parte do ajuntamento illicito, se não tiverem retirado do lugar um quarto de hora depois da terceira admoestação do Juiz de Paz, ou que, depois de desfeito o ajuntamento, se tornarem a reunir.

Pena - de multa de dez a cem mil réis.

Se tiverem commettido violencias antes da primeira admoestação do Juiz de Paz.

Penas - as mesmas estabelecidas nos artigos duzentos oitenta e seis, e duzentos oitenta e sete.

Artigo 294[editar]

Aquelles, que commetterem violencias, depois da primeira admoestação do Juiz de Paz.

Penas - de prisão com trabalho por um á tres annos, além das mais, em que tiverem incorrido pela violencia.

Se a violencia fôr feita contra o Juiz de Paz, ou contra as pessoas encarregadas de desfazer o ajuntamento.

Penas - de prisão com trabalho por dous a seis annos, além das mais, em que tiverem incorrido pela violencia.

Capítulo IV[editar]

Vadios e Mendigos.

Artigo 295[editar]

Não tomar qualquer pessoa uma occupação honesta, e util, de que passa subsistir, depois de advertido pelo Juiz de Paz, não tendo renda sufficiente.

Pena - de prisão com trabalho por oito a vinte e quatro dias.

Artigo 296[editar]

Andar mendigando:

I. Nos lugares, em que existem estabelecimentos publicos para os mendigos, ou havendo pessoa, que se offereça a sustental-os.

II. Quando os que mendigarem estiverem em termos de trabalhar, ainda que nos lugares não hajam os ditos estabelecimentos.

III. Quando fingirem chagas, ou outras enfermidades.

IV. Quando mesmo invalidos mendigarem em reunião de quatro, ou mais, não sendo pai, e filhos, e não se incluindo tambem no numero dos quatro as mulheres, que acompanharem seus maridos, e os moços, que guiarem os cégos.

Penas - de prisão simples, ou com trabalho, segundo o estado das forças do mendigo, por oito dias a um mez.

Capítulo V[editar]

Uso de Armas Defesas.

Artigo 297[editar]

Usar de armas offensivas, que forem prohibidas.

Penas - de prisão por quinze a sessenta dias, e de multa correspondente á metade do tempo, atém da perda das armas.

Artigo 298[editar]

Não incorrerão nas penas do artigo antecedente:

I. Os Officiaes de Justiça, andando em diligencia.

II. Os Militares da primeira e segunda linha, e ordenanças, andando em diligencia, ou em exercicio na fórma de seus regulamentos.

III. Os que obtiverem licença dos Juizes de Paz.

Artigo 299[editar]

As Camaras Municipaes declararão em editaes, quaes sejam as armas offensivas, cujo uso poderão permittir os Juizes de Paz; os casos, em que as poderão permittir; e bem assim quaes as armas offensivas, que será licito trazer, e usar sem licença aos occupados em trabalhos, para que ellas forem necessarias.

Capítulo VI[editar]

Fabrico, e Uso de Instrumentos para Roubar.

Artigo 300[editar]

Fabricar gazúa, ou ter, ou trazer comsigo de dia, ou de noite gazúa, ou outros instrumentos, ou apparelhos proprios para roubar.

Pena - de prisão com trabalho por dous mezes a tres annos.

Capítulo VII[editar]

Uso de Nomes Suppostos, e Titulos Indevidos.

Artigo 301[editar]

Usar de nome supposto, ou mudado, ou de algum titulo, distinctivo, ou condecoração, que não tenha.

Pena - de prisão por dez a sessenta dias, e multa correspondente á metade do tempo.

Artigo 302[editar]

Se em virtude do sobredito uso se tiver obtido o que de outro modo se não conseguiria.

Pena - a mesma, em que incorreria o réu, se obtivesse por violencia.

Capítulo VIII[editar]

Uso Indevido da Imprensa.

Artigo 303[editar]

Estabelecer officina de impressão, lithographia, ou gravura, sem declarar perante a Camara da cidade, ou villa, o seu nome, lugar, rua, e casa, em que pretende estabelecer, para ser escripto em livro proprio, que para esse effeito terão as Camaras; e deixar de participar a mudança de casa, sempre que ella aconteça.

Pena - de multa de doze a sessenta mil réis.

Artigo 304[editar]

Imprimir, lithographar, ou gravar qualquer escripto, ou estampa, sem nelle se declarar o nome do impressor, ou gravador, a terra em que está a officina, em que fôr impresso, lithographado, ou gravado, e o anno da impressão, lithographia, ou gravura; faltando-se a todas, ou a cada uma destas declarações.

Penas - de perda dos exemplares, em que houverem as faltas e de multa de vinte e cinco a cem mil réis.

Artigo 305[editar]

Imprimir, lithographar, ou gravar com falsidade todas, ou qualquer das declarações do artigo antecedente.

Penas - de perda dos exemplares e de multa de cincoenta a duzentos mil réis.

Artigo 306[editar]

Se a falsidade consistir em attribuir o escripto, ou estampa a impressor, ou gravador, autor, ou editor, que esteja actualmente vivo.

Penas - dobradas.

Artigo 307[editar]

Deixar de remetter ao Promotor um exemplar do escripto, ou obra impressa, no dia da sua publicação, e distribuição.

Pena - de multa de dez a trinta mil réis.

Disposições geraes

Artigo 308[editar]

Este Codigo não comprehende:

I. Os crimes de responsabilidade dos Ministros, e Conselheiros de Estado, os quaes serão punidos com as penas estabelecidas na lei respectiva.

II. Os crimes puramente militares, os quaes serão punidos na fórma das leis respectivas.

III. Os crimes contra o commercio, não especificados neste Codigo, os quaes continuarão a ser punidos como até aqui.

IV. Os crimes contra a policia, e economia particular das povoações, não especificados neste Codigo, os quaes serão punidos na conformidade das posturas municipaes.

Artigo 309[editar]

Todos os crimes commettidos antes da promulgação deste Codigo, que tiverem de ser sentenciados em primeira, ou segunda instancia, ou em virtude de revista concedida, serão punidos com as penas estabelecidas nas leis anteriores, quando forem menores: no caso porém de serem mais graves, poderão os delinquentes reclamar a imposição das que se estabelecem no presente Codigo.

Artigo 310[editar]

Todas as acções, ou omissões, que, sendo criminosas pelas leis anteriores, não são como taes, consideradas no presente Codigo, não sujeitarão a pena alguma, que já não esteja imposta por sentença, que se tenha tornado irrevogavel, ou de que se não conceda revista.

Esceptuam-se.

As acções, ou omissões não declaradas neste Codigo, e que não são puramente criminaes, ás quaes pelos regimentos das autoridades, e leis sobre o processo, esteja imposta alguma multa, ou outra pena, pela falta de cumprimento, de algum dever, ou obrigação.

Artigo 311[editar]

A pena de galés temporaria será substituida pela de prisão com trabalho pelo mesmo tempo, logo que houverem casas de correcção nos lugares, em que os réos estiverem cumprindo as sentenças.

Artigo 312[editar]

A accusação por parte da Justiça continuará em todos os crimes, em que até agora tinha lugar; e nos de abuso da liberdade de communicar os pensamentos, accusará o Promotor nos casos declarados nos artigos noventa, noventa e nove, cento e dezanove, duzentos quarenta e dous, duzentos quarenta e quatro, duzentos setenta e sete, duzentos setenta e oito, e duzentos setenta e nove.

Artigo 313[editar]

Ficam revogadas todas as leis em contrario.