Codigo Criminal do Imperio do Brazil/Parte Terceira/II

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Capítulo I[editar]

Dos Crimes Contra a Segurança da Pessoa, e Vida.

Seção I[editar]

Homicidio.

Artigo 192[editar]

Matar alguém com qualquer das circumstancias aggravantes mencionadas no artigo dezaseis, numeros dous, sete, dez, onze, doze, treze, quatorze, e dezasete.

Penas - de morte no gráo maximo; galés perpetuas no médio; e de prisão com trabalho por vinte annos no minimo.

Artigo 193[editar]

Se o homicidio não tiver sido revestido das referidas circumstancias aggravantes.

Penas - de galés perpetuas no grão maximo; de prisão com trabalho por doze annos no médio; e por seis no minimo.

Artigo 194[editar]

Quando a morte se verificar, não porque o mal causado fosse mortal, mas porque o offendido não applicasse toda a necessaria diligencia para removel-o.

Penas - de prisão com trabalho por dous a dez annos.

Artigo 195[editar]

O mal se julgará mortal a juizo dos facultativos; e, discordando estes, ou não sendo possivel ouvil-os, será o réo punido com as penas do artigo antecedente.

Artigo 196[editar]

Ajudar alguem a suicidar-se, ou fornecer-lhe meios para esse fim com conhecimento de causa.

Penas - de prisão por dous a seis annos.

Seção II[editar]

Infanticidio.

Artigo 197[editar]

Matar algum recemnascido.

Penas - de prisão por tres a doze annos, e de multa correspondente á metade do tempo.

Artigo 198[editar]

Se a propria mãi matar o filho recem-nascido para occultar a sua deshonra.

Penas - de prisão com trabalho por um a tres annos.

Seção III[editar]

Aborto.

Artigo 199[editar]

Occasionar aborto por qualquer meio empregado interior, ou exteriormente com consentimento da mulher pejada.

Penas - de prisão com trabalho por um a cinco annos.

Se este crime fôr commettido sem consentimento da mulher pejada.

Penas - dobradas.

Artigo 200[editar]

Fornecer com conhecimento de causa drogas, ou quaesquer meios para produzir o aborto, ainda que este se não verifique.

Penas - de prisão com trabalho por dous a seis annos.

Se este crime fôr commettido por medico, boticario, cirurgião, ou praticante de taes artes.

Penas - dobradas.

Seção IV[editar]

Ferimentos, e Outras Offensas Physicas.

Artigo 201[editar]

Ferir ou cortar qualquer parte do corpo humano, ou fazer qualquer outra offensa physica, com que se cause dôr ao offendido.

Penas - de prisão por um mez a um anno, e multa correspondente á metade do tempo.

Artigo 202[editar]

Se houver, ou resultar mutilação, ou destruição de algum membro, ou orgão, dotado de um movimento distincto, ou de uma funcção especifica, que se pôde perder, sem perder a vida.

Penas - de prisão com trabalho por um a seis annos, e de multa correspondente á metade do tempo.

Artigo 203[editar]

A mesma pena se imporá no caso, em que houver, ou resultar inhabilitação de membro, ou orgão, sem que comtudo fique destruido.

Artigo 204[editar]

Quando do ferimento, ou outra offensa physica resultar deformidade.

Penas - de prisão com trabalho por um a tres annos, e multa correspondente á metade do tempo.

Artigo 205[editar]

Se o mal corporeo resultante do ferimento, ou da offensa physica produzir gravo incommodo de saude, ou inhabilitação de serviço por mais de um mez.

Penas - de prisão com trabalho por um a oito annos, e de multa correspondente á metade do tempo.

Art. 206. Causar á alguem qualquer dôr physica com o unico fim de o injuriar.

Penas - de prisão por dous mezes a dous annos, e de multa correspondente a duas terças partes do tempo. Se para esse fim se usar de instrumento aviltante, ou se fizer offensa em lugar publico.

Penas - de prisão por quatro mezes a quatro annos, e de multa correspondente a duas terças portes do tempo.

Seção V[editar]

Ameaças.

Artigo 207[editar]

Prometter, ou protestar fazer mal á alguem por meio de ameaças, ou seja de palavra, ou por escripto, ou por outro qualquer modo.

Penas - de prisão por um a seis mezes, e de multa correspondente a duas terças partes do tempo.

Quando este crime fôr commettido contra corporações, as penas serão dobradas.

Artigo 208[editar]

Se as ameaças forem feitas em publico, julgar-se-ha circumstancia aggravante.

Seção VI[editar]

Entrada na Casa Alheia.

Artigo 209[editar]

Entrar na casa alheia de noite, sem consentimento de quem nella morar.

Penas - de prisão por dous a seis mezes, e multa correspondente á metade do tempo.

Não terá porém lugar a pena:

I. No caso de incendio, ou ruina actual da casa, ou das immediatas.

II. No caso de inundação.

III. No caso de ser de dentro pedido soccorro.

IV. No caso de se estar alli commettendo algum crime de violencia contra pessoa.

Artigo 210[editar]

Entrar na casa de dia, fóra dos casos permittidos, e sem as formalidades legaes.

Penas - de prisão por um a tres mezes, e de multa correspondente á metade do tempo.

Artigo 211[editar]

A entrada de dia na casa do cidadão é permittida:

I. Nos casos em que se permute de noite.

II. Nos casos, em que na conformidade das leis se deve proceder á prisão dos delinquentes; á busca, ou apprehenção de objectos roubados, furtados, ou havidos por meios criminosos; á investigação de instrumentos, ou vestigios de delicto, ou de contrabandos, e á penhora, ou sequestro de bens, que se occultam, ou negam.

III. Nos casos de flagrante delicto, ou em seguimento do réo achado em flagrante.

Artigo 212[editar]

Nos casos mencionados no numero segundo do artigo antecedente se guardarão as seguintes formalidades:

I. Ordem escripta de quem determinou a entrada com expressa designação da diligencia, e do motivo della.

II. Assistencia de um Escrivão, ou de qualquer Official de Justiça com duas testemunhas pelo menos.

Artigo 213[editar]

O Official de Justiça encarregado da diligencia executal-a-ha com toda a attenção para com os moradores da casa, respeitando a modestia, e o decoro da familia; e de tudo se lavrará auto assignado pelo Official, e pelas testemunhas.

A transgressão deste artigo será punida com a prisão de cinco dias a um mez.

Artigo 214[editar]

As disposições sobre a entrada na casa do cidadão, não comprehendem as casas publicas de estalagem, e de jogo, e as lojas de bebidas, tabernas, e outras semelhantes, emquanto estiverem abertas.

Seção VII[editar]

Abertura de Cartas.

Artigo 215[editar]

Tirar maliciosamente do Correio cartas, que lhe não pertencerem, sem autorização da pessoa, a quem vierem dirigidas.

Penas - de prisão por um a tres mezes, e de multa de dez a cincoenta mil réis.

Artigo 216[editar]

Tirar, ou haver as cartas da mão, ou do poder de algum portador particular por qualquer maneira que seja.

Penas - as mesmas do artigo antecedente, além das em que incorrer, se para commetter este crime usar o réo de violencia, ou arrombamento.

Artigo 217[editar]

As penas dos artigos antecedentes serão dobradas, em caso de se descobrir a outro o que nas cartas se contiver, em todo ou em parte.

Artigo 218[editar]

As cartas, que forem tiradas por qualquer das maneiras mencionadas, não serão admittidas em Juizo.

Capítulo II[editar]

Dos Crimes Contra a Segurança da Honra.

Seção I[editar]

Estupro.

Artigo 219[editar]

Deflorar mulher virgem, menor de dezasete annos.

Penas - de desterro para fóra da comarca, em que residir a deflorada, por um a tres annos, e de dotar a esta.

Seguindo-se o casamento, não terão lugar as penas.

Artigo 220[editar]

Se o que commetter o estupro, tiver em seu poder ou guarda a deflorada.

Penas - de desterro para fóra da provincia, em que residir a deflorada, por dous a seis annos, e de dotar esta.

Artigo 221[editar]

Se o estupro fôr commettido por parente da deflorada em gráo, que não admitta dispensa para casamento.

Penas - de degredo por dous a seis annos para a provincia mais remota da em que residir a deflorada, e de dotar a esta.

Artigo 222[editar]

Ter copula carnal por meio de violencia, ou ameaças, com qualquer mulher honesta.

Penas - de prisão por tres a doze annos, e de dotar a offendida.

Se a violentada fôr prostituta.

Penas - de prisão por um mez a dous annos.

Artigo 223[editar]

Quando houver simples offensa pessoal para fim libidinoso, causando dôr, ou algum mal corporeo a alguma mulher, sem que se verifique a copula carnal.

Penas - de prisão por um a seis mezes, e de multa correspondente á metade do tempo, além das em que incorrer o réo pela offensa.

Artigo 224[editar]

Seduzir mulher honesta, menor dezasete annos, e ter com ella copula carnal.

Penas - de desterro para fóra da comarca, em que residir a seduzida, por um a tres annos, e de dotar a esta.

Artigo 225[editar]

Não haverão as penas dos tres artigos antecedentes os réos, que casarem com as offendidas.

Seção II[editar]

Rapto.

Artigo 226[editar]

Tirar para fim libidinoso, por violencia, qualquer mulher da casa, ou lugar em que estiver.

Penas - de dous a dez annos de prisão com trabalho, e de dotar a offendida.

Artigo 227[editar]

Tirar para fim libidinoso, por meio de affagos e promessas, alguma mulher virgem, ou reputada tal, que seja menor de dezasete annos, de casa de seu pai, tutor, curador, ou outra qualquer pessoa, em cujo poder, ou guarda estiver.

Penas - de prisão por um a tres annos, e de dotar a offendida.

Artigo 228[editar]

Seguindo-se o casamento em qualquer destes casos, não terão lugar as penas.

Seção III[editar]

Calumnia e Injuria.

Artigo 229[editar]

Julgar-se-ha crime de calumnia, o attribuir falsamente a algum um facto, que a lei tenha qualificado criminoso, e em que tenha lugar a acção popular, ou procedimento official de Justiça.

Artigo 230[editar]

Se o crime de calumnia fôr commettido por meio de papeis impressos, lithographados, ou gravados, que se distribuirem por mais de quinze pessoas contra corporações, que exerçam autoridade publica.

Penas - de prisão por oito mezes a dous annos, e de multa correspondente á metade do tempo.

Artigo 231[editar]

Se a calumnia fôr contra qualquer Depositario, ou Agente de Autoridade publica, em razão do seu officio.

Penas - de prisão por seis a dezoito mezes, e de multa correspondente á metade do tempo.

Artigo 232[editar]

Se fôr contra qualquer pessoa particular, ou empregado publico, sem ser em razão do seu officio.

Penas - de prisão por quatro mezes a um anno, e de multa correspondente á metade do tempo.

Artigo 233[editar]

Quando a calumnia fôr commettida sem ser por algum dos meios mencionados no artigo duzentos e trinta, será punida com metade das penas estabelecidas.

Artigo 234[editar]

O que provar o facto criminoso imputado, ficará isento de toda a pena.

Artigo 235[editar]

A accusação proposta em Juizo, provando-se ser calumniosa, e intentada de má fé, será punida com a pena do crime imputado, no gráo minimo.

Artigo 236[editar]

Julgar-se-ha crime de injuria:

I. Na imputação do um tacto criminoso não comprehendido no artigo duzentos e vinte e nove.

II. Na imputação de vicios ou defeitos, que possam expôr ao odio, ou desprezo publico.

III. Na imputação vaga de crimes, ou vicios sem factos especificados.

IV. Em tudo o que pôde prejudicar a reputação de alguem.

V. Em discursos, gestos, ou signaes reputados insultantes na opinião publica.

Artigo 237[editar]

O crime de injuria commettido por algum dos meios mencionados no artigo duzentos e trinta.

I. Contra corporações, que exerçam autoridade publica.

Penas - de prisão por quatro mezes a um anno, e de multa correspondente á metade do tempo.

II. Contra qualquer Depositario, ou Agente de Autoride publica em razão do seu officio.

Penas - de prisão por tres a nove mezes, e de multa correspondente á metade do tempo.

III. Contra pessoas particulares, ou empregados publicos, sem ser em razão de seu officio.

Penas - de prisão por dous a seis mezes, e de multa correspondente á metade do tempo.

Artigo 238[editar]

Quando a injuria fôr commettida, sem ser por algum dos meios mencionados no artigo duzentos e trinta, será punida com metade das penas estabelecidas.

Artigo 239[editar]

As imputações feitas a qualquer Corporação, Depositario, ou Agente de Autoridade publica, contendo factos ou omissões contra os deveres dos seus empregos, não sujeitam a pena alguma, provando-se a verdade dellas.

Aquellas porém que contiverem factos da vida privada, ou sejam contra empregadas publicos, ou contra particulares, não serão admittidas á prova.

Artigo 240[editar]

Quando a calumnia, ou injuria forem equivocas, poderá o offendido pedir explicações em Juizo, ou fóra delle.

O que em Juizo se recusar a estas explicações, ficará sujeito ás penas da calumnia, ou injuria, á que o equivoco der lugar.

Artigo 241[editar]

O Juiz que encontrar calumnias, ou injurias, escriptas em allegações, ou cotas de autos publicos, as mandará riscar a requerimento da parte offendida, e poderá condemnar o seu autor, sendo advogado, ou procurador, em suspensão do officio por oito a trinta dias, e em multa de quatro a quarenta mil réis.

Artigo 242[editar]

As calumnias, e as injurias contra o Imperador, ou contra a Assembléa Geral Legislativa, serão punidas com o dobro das penas estabelecidas nos artigos duzentos e trinta, e duzentos e trinta e tres.

Artigo 243[editar]

As calumnias, e as injurias feitas a todos, ou a cada um dos Agentes do Poder Executivo, não se entendem directa, nem indirectamente feitas ao Imperador.

Artigo 244[editar]

As calumnias, e as injurias contra o Regente, ou a Regencia, o Principe Imperial, a Imperatriz, ou contra cada uma das Camaras Legislativas, serão punidas com o dobro das penas estabelecidas nos artigos duzentos trinta e um, duzentos trinta e tres, duzentos trinta e sete paragrapho segundo, e duzentos e trinta e oito.

Artigo 245[editar]

As calumnias, e as injurias contra alguma das pessoas da Familia Imperial, ou contra algum dos membros das Camaras Legislativas, em razão do exercido das suas attribuições, serão punidas com o dobro das penas estabelecidas nos artigos duzentos trinta e dous, duzentos trinta e tres, duzentos trinta e sete paragrapho terceiro, e duzentos trinta e oito.

Artigo 246[editar]

Provando-se que o delinquente teve paga, ou promessa para commetter alguma calumnia ou injuria, além das outras penas, incorrerá mais na do duplo dos valores recebidos, ou promettidos.

Capítulo III[editar]

Dos Crimes Contra a Segurança do Estado Civil, e Domestico.

Seção I[editar]

Celebração do Matrimonio Contra as Leis do Imperio

Artigo 247[editar]

Receber o Ecclesiastico, em matrimonio, a contrahentes, que se não mostrarem habilitados na conformidade das Leis.

Penas - de prisão por dous mezes a um anno, e de multa correspondente á metade do tempo.

Artigo 248[editar]

Contrahir matrimonio clandestino.

Penas - de prisão por dous mezes a um anno.

Seção II[editar]

Polygamia.

Artigo 249[editar]

Contrahir matrimonio segunda, ou mais vezes, sem se ter dissolvido o primeiro.

Penas - de prisão com trabalho por um a seis annos, e de multa correspondente á metade do tempo.

Seção III[editar]

Adulterio.

Artigo 250[editar]

A mulher casada, que commetter adulterio, será punida com a pena de prisão com trabalho por um a tres annos.

A mesma pena se imporá neste caso ao adultero.

Artigo 251[editar]

O homem casado, que tiver concubina, teúda, e manteúda, será punido com as penas do artigo antecedente.

Artigo 252[editar]

A accusação deste crime não será permittida á pessoa, que não seja marido, ou mulher; e estes mesmos não terão direito de accusar, se em algum tempo tiverem consentido no adulterio.

Artigo 253[editar]

A accusação por adulterio deverá ser intentada conjunctamente contra a mulher, e o homem, com quem ella tiver commettido o crime, se fôr vivo; e um não poderá ser condemnado sem o outro.

Seção IV[editar]

Parto Suposto, e Outros Fingimentos.

Artigo 254[editar]

Fingir-se a mulher prenhe, e dar o parto alheio por seu, ou sendo verdadeiramente prenhe, substituir a sua por outra criança; furtar alguma criança, occultal-a, ou trocal-a por outra.

Penas - de prisão por quatro mezes a dous annos, e multa correspondente á metade do tempo, além das mais, em que incorrer.

Artigo 255[editar]

Fingir-se o homem marido de uma mulher contra a vontade desta para usurpar direitos maritaes; ou fingir-se a mulher casada com um homem para o mesmo fim.

Penas - de prisão com trabalho por um a seis annos, e multa correspondente á metade do tempo.

Se este fingimento fôr de accôrdo do homem com a mulher em prejuizo de terceiro, além das referidas penas, soffrerão mais as em que incorrerem pelo mal, que causarem.

Artigo 256[editar]

Fingir-se empregado publico.

Penas - de prisão por um mez a um anno, e de multa correspondente á metade do tempo.