Constituição da República de Angola/I
Aspeto
Princípios Fundamentais
Artigo 1.º (República de Angola)
- Angola é uma República soberana e independente, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade do povo angolano, que tem como objectivo fundamental a construção de uma sociedade livre, justa, democrática, solidária, de paz, igualdade e progresso social.
Artigo 2.º (Estado Democrático de Direito)
- A República de Angola é um Estado Democrático de Direito que tem como fundamentos a soberania popular, o primado da Constituição e da lei, a separação de poderes e interdependência de funções, a unidade nacional, o pluralismo de expressão e de organização política e a democracia representativa e participativa.
- A República de Angola promove e defende os direitos e liberdades fundamentais do Homem, quer como indivíduo quer como membro de grupos sociais organizados, e assegura o respeito e a garantia da sua efectivação pelos poderes legislativo, executivo e judicial, seus órgãos e instituições, bem como por todas as pessoas singulares e colectivas.
Artigo 3.º (Soberania)
- A soberania, una e indivisível, pertence ao povo, que a exerce através do sufrágio universal, livre, igual, directo, secreto e periódico, do referendo e das demais formas estabelecidas pela Constituição, nomeadamente para a escolha dos seus representantes.
- O Estado exerce a sua soberania sobre a totalidade do território angolano, compreendendo este, nos termos da presente Constituição, da lei e do direito internacional, a extensão do espaço terrestre, as águas interiores e o mar territorial, bem como o espaço aéreo, o solo e o subsolo, o fundo marinho e os leitos correspondentes.
- O Estado exerce jurisdição e direitos de soberania em matéria de conservação, exploração e aproveitamento dos recursos naturais, biológicos e não biológicos, na zona contígua, na zona económica exclusiva e na plataforma continental, nos termos da lei e do direito internacional.
Artigo 4.º (Exercício do poder político)
- O poder político é exercido por quem obtenha legitimidade mediante processo eleitoral livre e democraticamente exercido, nos termos da Constituição e da lei.
- São ilegítimos e criminalmente puníveis a tomada e o exercício do poder político com base em meios violentos ou por outras formas não previstas nem conformes com a Constituição.
Artigo 5.º (Organização do território)
- O território da República de Angola é o historicamente definido pelos limites geográficos de Angola tais como existentes a 11 de Novembro de 1975, data da Independência Nacional.
- O disposto no número anterior não prejudica as adições que tenham sido ou que venham a ser estabelecidas por tratados internacionais.
- A República de Angola organiza-se territorialmente, para fins político-administrativos, em Províncias e estas em Municípios, podendo ainda estruturar-se em Comunas e em entes territoriais equivalentes, nos termos da Constituição e da lei.
- A definição dos limites e das características dos escalões territoriais, a sua criação, modificação ou extinção, no âmbito da organização político-administrativa, bem como a organização territorial para fins especiais, tais como económicos, militares, estatísticos, ecológicos ou similares, são fixadas por lei.
- A lei fixa a estruturação, a designação e a progressão das unidades urbanas e dos aglomerados populacionais.
- O território angolano é indivisível, inviolável e inalienável, sendo energicamente combatida qualquer acção de desmembramento ou de separação de suas parcelas, não podendo ser alienada parte alguma do território nacional ou dos direitos de soberania que sobre ele o Estado exerce.
Artigo 6.º (Supremacia da Constituição e legalidade)
- A Constituição é a lei suprema da República de Angola.
- O Estado subordina-se à Constituição e funda-se na legalidade, devendo respeitar e fazer respeitar as leis.
- As leis, os tratados e os demais actos do Estado, dos órgãos do poder local e dos entes públicos em geral só são válidos se forem conformes à Constituição.
Artigo 7.º (Costume)
- É reconhecida a validade e a força jurídica do costume que não seja contrário à Constituição nem atente contra a dignidade da pessoa humana.
Artigo 8.º (Estado unitário)
- A República de Angola é um Estado unitário que respeita, na sua organização, os princípios da autonomia dos órgãos do poder local e da desconcentração e descentralização administrativas, nos termos da Constituição e da lei.
Artigo 9.º (Nacionalidade)
- A nacionalidade angolana pode ser originária ou adquirida.
- É cidadão angolano de origem o filho de pai ou de mãe de nacionalidade angolana, nascido em Angola ou no estrangeiro.
- Presume-se cidadão angolano de origem o recém-nascido achado em território angolano.
- Nenhum cidadão angolano de origem pode ser privado da nacionalidade originária.
- A lei estabelece os requisitos de aquisição, perda e reaquisição da nacionalidade angolana.
Artigo 10.º (Estado laico)
- A República de Angola é um Estado laico, havendo separação entre o Estado e as igrejas, nos termos da lei.
- O Estado reconhece e respeita as diferentes confissões religiosas, as quais são livres na sua organização e no exercício das suas actividades, desde que as mesmas se conformem à Constituição e às leis da República de Angola.
- O Estado protege as igrejas e as confissões religiosas, bem como os seus lugares e objectos de culto, desde que não atentem contra a Constituição e a ordem pública e se conformem com a Constituição e a lei.
Artigo 11.º (Paz e Segurança Nacional)
- A República de Angola é uma Nação de vocação para a paz e o progresso, sendo um dever do Estado e um direito e responsabilidade de todos garantir, com respeito pela Constituição e pela lei, bem como pelas convenções internacionais, a paz e a segurança nacional.
- A paz tem como base o primado do direito e da lei e visa assegurar as condições necessárias à estabilidade e ao desenvolvimento do País.
- A segurança nacional é baseada no primado do direito e da lei, na valorização do sistema integrado de segurança e no fortalecimento da vontade nacional, visando a garantia da salvaguarda do Estado e o asseguramento da estabilidade e do desenvolvimento, contra quaisquer ameaças e riscos.
Artigo 12.º (Relações internacionais)
- A República de Angola respeita e aplica os princípios da Carta da Organização das Nações Unidas e da Carta da União Africana e estabelece relações de amizade e cooperação com todos os Estados e povos, na base dos seguintes princípios:
- a) Respeito pela soberania e independência nacional;
- b) Igualdade entre os Estados;
- c) Direito dos povos à autodeterminação e à independência;
- d) Solução pacífica dos conflitos;
- e) Respeito dos direitos humanos;
- f) Não ingerência nos assuntos internos dos outros Estados;
- g) Reciprocidade de vantagens;
- h) Repúdio e combate ao terrorismo, narcotráfico, racismo, corrupção e tráfico de seres e órgãos humanos;
- i) Cooperação com todos os povos para a paz, justiça e progresso da humanidade.
- 2. A República de Angola defende a abolição de todas as formas de colonialismo, agressão, opressão, domínio e exploração nas relações entre os povos.
- 3. A República de Angola empenha-se no reforço da identidade africana e no fortalecimento da acção dos Estados africanos em favor da potenciação do património cultural dos povos africanos.
- 4. O Estado angolano não permite a instalação de bases militares estrangeiras no seu território, sem prejuízo da participação, no quadro das organizações regionais ou internacionais, em forças de manutenção da paz e em sistemas de cooperação militar e de segurança colectiva.
Artigo 13.º (Direito Internacional)
- O direito internacional geral ou comum, recebido nos termos da presente Constituição, faz parte integrante da ordem jurídica angolana.
- Os tratados e acordos internacionais regularmente aprovados ou ratificados vigoram na ordem jurídica angolana após a sua publicação oficial e entrada em vigor na ordem jurídica internacional e enquanto vincularem internacionalmente o Estado angolano.
Artigo 14.º (Propriedade privada e livre iniciativa)
- O Estado respeita e protege a propriedade privada das pessoas singulares ou colectivas e a livre iniciativa económica e empresarial exercida nos termos da Constituição e da lei.
Artigo 15.º (Terra)
- A terra, que constitui propriedade originária do Estado, pode ser transmitida para pessoas singulares ou colectivas, tendo em vista o seu racional e efectivo aproveitamento, nos termos da Constituição e da lei.
- São reconhecidos às comunidades locais o acesso e o uso das terras, nos termos da lei.
- O disposto nos números anteriores não prejudica a possibilidade de expropriação por utilidade pública, mediante justa indemnização, nos termos da lei.
Artigo 16.º (Recursos naturais)
- Os recursos naturais, sólidos, líquidos ou gasosos existentes no solo, subsolo, no mar territorial, na zona económica exclusiva e na plataforma continental sob jurisdição de Angola são propriedade do Estado, que determina as condições para a sua concessão, pesquisa e exploração, nos termos da Constituição, da lei e do Direito Internacional.
Artigo 17.º (Partidos Políticos)
- Os partidos políticos, no quadro da presente Constituição e da lei, concorrem, em torno de um projecto de sociedade e de programa político, para a organização e para a expressão da vontade dos cidadãos, participando na vida política e na expressão do sufrágio universal, por meios democráticos e pacíficos, com respeito pelos princípios da independência nacional, da unidade nacional e da democracia política.
- A constituição e o funcionamento dos partidos políticos devem, nos termos da lei, respeitar os seguintes princípios fundamentais:
- a) Carácter e âmbito nacionais;
- b) Livre constituição;
- c) Prossecução pública dos fins;
- d) Liberdade de filiação e filiação única;
- e) Utilização exclusiva de meios pacíficos na prossecução dos seus fins e interdição da criação ou utilização de organização militar, paramilitar ou militarizada;
- f) Organização e funcionamento democráticos;
- g) Representatividade mínima fixada por lei;
- h) Proibição de recebimento de contribuições de valor pecuniário e económico, provenientes de governos ou de instituições governamentais estrangeiros;
- i) Prestação de contas do uso de fundos públicos.
- 3. Os partidos políticos devem, nos seus objectivos, programa e prática, contribuir para:
- a) A consolidação da nação angolana e da independência nacional;
- b) A salvaguarda da integridade territorial;
- c) O reforço da unidade nacional;
- d) A defesa da soberania nacional e da democracia;
- e) A protecção das liberdades fundamentais e dos direitos da pessoa humana;
- f) A defesa da forma republicana de governo e do carácter laico do Estado.
- 4. Os partidos políticos têm direito a igualdade de tratamento por parte das entidades que exercem o poder público, direito a um tratamento imparcial da imprensa pública e direito de oposição democrática, nos termos da Constituição e da lei.
Artigo 18.º (Símbolos nacionais)
- São símbolos nacionais da República de Angola a Bandeira Nacional, a Insígnia Nacional e o Hino Nacional.
- A Bandeira Nacional, a Insígnia Nacional e o Hino Nacional, símbolos da soberania e da independência nacionais, da unidade e da integridade da República de Angola, são os adoptados aquando da proclamação da independência nacional, a 11 de Novembro de 1975 e tal como constam da Lei Constitucional de 1992 e dos anexos I, II e III da presente Constituição.
- A lei estabelece as especificações técnicas e as disposições sobre a deferência e o uso da Bandeira Nacional, da Insígnia Nacional e do Hino Nacional.
Artigo 19.º (Línguas)
- A língua oficial da República de Angola é o português.
- O Estado valoriza e promove o estudo, o ensino e a utilização das demais línguas de Angola, bem como das principais línguas de comunicação internacional.
Artigo 20.º (Capital da República de Angola)
- A capital da República de Angola é Luanda.
Artigo 21.º (Tarefas fundamentais do Estado)
- Constituem tarefas fundamentais do Estado angolano:
- a) Garantir a independência nacional, a integridade territorial e a soberania nacional;
- b) Assegurar os direitos, liberdades e garantias fundamentais;
- c) Criar progressivamente as condições necessárias para tornar efectivos os direitos económicos, sociais e culturais dos cidadãos;
- d) Promover o bem-estar, a solidariedade social e a elevação da qualidade de vida do povo angolano, designadamente dos grupos populacionais mais desfavorecidos;
- e) Promover a erradicação da pobreza;
- f) Promover políticas que permitam tornar universais e gratuitos os cuidados primários de saúde;
- g) Promover políticas que assegurem o acesso universal ao ensino obrigatório gratuito, nos termos definidos por lei;
- h) Promover a igualdade de direitos e de oportunidades entre os angolanos, sem preconceitos de origem, raça, filiação partidária, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação;
- i) Efectuar investimentos estratégicos, massivos e permanentes no capital humano, com destaque para o desenvolvimento integral das crianças e dos jovens, bem como na educação, na saúde, na economia primária e secundária e noutros sectores estruturantes para o desenvolvimento auto-sustentável;
- j) Assegurar a paz e a segurança nacional;
- k) Promover a igualdade entre o homem e a mulher;
- l) Defender a democracia, assegurar e incentivar a participação democrática dos cidadãos e da sociedade civil na resolução dos problemas nacionais;
- m) Promover o desenvolvimento harmonioso e sustentado em todo o território nacional, protegendo o ambiente, os recursos naturais e o património histórico, cultural e artístico nacional;
- n) Proteger, valorizar e dignificar as línguas angolanas de origem africana, como património cultural, e promover o seu desenvolvimento, como línguas de identidade nacional e de comunicação;
- o) Promover a melhoria sustentada dos índices de desenvolvimento humano dos angolanos;
- p) Promover a excelência, a qualidade, a inovação, o empreendedorismo, a eficiência e a modernidade no desempenho dos cidadãos, das instituições e das empresas e serviços, nos diversos aspectos da vida e sectores de actividade;
- q) Outras previstas na Constituição e na lei.