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Constituição portuguesa de 1838/Título V: Do Poder Legislativo

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CAPÍTULO I

Das Cortes e suas atribuições



ARTIGO 36º — As Cortes compõem-se de duas Câmaras: Câmara de Senadores e Câmara de Deputados.

ARTIGO 37º — Compete às Cortes:

1.º — Fazer as Leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las;
2.º — Velar na observância da Constituição e das Leis, e promover o bem geral da Nação;
3.º — Tomar juramento ao Rei, Regente ou Regência, e ao Príncipe Real;
4.º — Eleger o Regente nos casos em que a Constituição prescreve; a marcar os limites da sua autoridade, ou ele seja electivo, ou chamado pelo direito de Sucessão;
5.º — Reconhecer o Príncipe Real como Sucessor da Coroa, na primeira reunião depois do seu nascimento, e aprovar o plano de sua educação;
6.º — Nomear tutor ao Rei menor, não sendo vivo seu Pai ou Avô, ou não lhe tendo sido nomeado em testamento;
7.º — Confirmar o tutor nomeado pelo Rei, se este abdicar ou sair do Reino;
8.º — Resolver as dúvidas que ocorrerem sobre a Sucessão da Coroa;
9.º — Aprovar, antes de serem ratificados, os tratados de aliança, subsídios, comércio, troca ou cessão de alguma porção de território português ou de direito a ela;
10.º — Fixar anualmente, sobre proposta ou informação do Governo, as forças de terra e mar;
11.º — Conceder ou negar a entrada de forças estrangeiras de terra ou de mar;
12.º — Votar anualmente os impostos, e fixar a receita e despesa do Estado;
13.º — Autorizar o Governo para contrair empréstimos, estabelecendo ou aprovando previamente, excepto nos casos de urgência, as condições com que devem ser feitos;
14.º — Estabelecer meios convenientes para o pagamento da dívida pública;
15.º — Regular a administração dos Bens Nacionais, e decretar a sua alienação;
16.º — Criar ou suprimir empregos, e estabelecer-lhes ordenado;
17.º — Determinar o valor, peso, lei, inscrição, tipo e denominação das moedas, assim como o padrão dos pesos e medidas;

ARTIGO 38º — Cada uma das Câmaras, no princípio das sessões ordinárias, examinará se a Constituição e as Leis têm sido observadas.

ARTIGO 39º — Cada uma das Câmaras tem o direito de proceder, por meio de comissões de inquérito, ao exame de qualquer objecto de sua competência.

ARTIGO 40º — Nenhuma das Câmaras pode tomar resolução alguma sem que esteja presente a maioria da totalidade de seus Membros.

ARTIGO 41º — Haverá em cada ano uma sessão ordinária de Cortes que nunca poderá durar menos de três meses; no caso de dissolução, as três mesas principiarão a contar-se da reunião da nova Câmara dos Deputados.

ARTIGO 42º — A sessão de abertura será sempre celebrada no dia 2 de Janeiro; e assim esta como a de encerramento serão Reais.

§ único — Tanto uma como outra se farão em Cortes Gerais, reunidas ambas as Câmaras, e ficando os Senadores à direita e os Deputados à esquerda.

ARTIGO 43º — Cada uma das Câmaras elege o seu Presidente, Vice-Presidente e Secretários.

ARTIGO 44º — As sessões de ambas as Câmaras serão públicas, excepto nos casos em que o bem do Estado exigir que sejam secretas.

ARTIGO 45º — Na reunião de ambas as Câmaras, o Presidente da Câmara dos Senadores dirige os trabalhos.

ARTIGO 46º — Ninguém pode ser ao mesmo tempo Membro de ambas as Câmaras.

ARTIGO 47º — Os Senadores e os Deputados são invioláveis por suas opiniões e votos em Cortes.

ARTIGO 48º — Nenhum Senador ou Deputado pode ser preso sem ordem da respectiva Câmara, excepto nos casos de flagrante delito.

§ único — Se algum Senador ou Deputado for pronunciado, o Juiz suspendendo todo o ulterior procedimento, dará conta à respectiva Câmara; a qual decidirá se o processo há-de continuar, e se o Deputado ou Senador pronunciado deve ser ou não suspenso do exercício de suas funções.

ARTIGO 49º — Nenhum Senador ou Deputado, desde o dia em que a sua eleição constar na competente Secretaria de Estado, pode aceitar ou solicitar, para si ou parente seu, pensão ou condecoração alguma, nem emprego provido pelo Governo, salvo se lhe competir por antiguidade ou escala na carreira da sua profissão.

ARTIGO 50º — Os Senadores e Deputados podem ser nomeados Ministros e Secretários de Estado, deixando imediatamente vagos os seus lugares; mas desde logo se procederá a nova eleição, e se forem reeleitos, poderão acumular ambas as funções.

ARTIGO 51º — Os Senadores e Deputados, durante o tempo das sessões, ficam inibidos do exercício de qualquer emprego, excepto do de Ministro e Secretário de Estado.

§ único — No intervalo das sessões não irão exercer os seus empregos, nem poderão ser empregados pelo Governo quando isso os impossibilite de se reunirem no tempo da convocação das Cortes Gerais.

ARTIGO 52º — Nos casos em que o bem do Estado exigir que algum Senador ou Deputado saia das Cortes para outro serviço, a respectiva Câmara o poderá autorizar.




CAPÍTULO II

Da Câmara dos Deputados



ARTIGO 53º — A Câmara dos Deputados é electiva e trienal.

ARTIGO 54º — É privativa da Câmara dos Deputados a iniciativa:

1.º— Sobre impostos;
2.º — Sobre recrutamento;

ARTIGO 55º — Também principiará na Câmara dos Deputados a discussão das propostas do Poder Executivo.

ARTIGO 56º — É privativa atribuição da mesma Câmara decretar a acusação dos Ministros e Secretários de Estado.

ARTIGO 57º — Os Deputados têm direito a um subsídio durante as sessões, e a serem indemnizados pelas despesas da vinda e volta.

§ único — Os Deputados das Províncias de Ásia e da África que não tiverem domicílio no continente do Reino e Ilhas Adjacentes, vencerão também um subsídio no intervalo das sessões.



CAPITULO III

Da Câmara dos Senadores



ARTIGO 58º — A Câmara dos Senadores é electiva e temporária.

ARTIGO 59º — O número dos Senadores será, pelo menos, igual à metade do número dos Deputados.

ARTIGO 60º — O Príncipe Real, logo que complete dezoito anos de idade, é Senador de Direito; mas só tem voto aos vinte e cinco anos.

ARTIGO 61º — É privativa atribuição da Câmara dos Senadores:

1.º — Conhecer dos débitos individuais cometidos pelos Membros da Família Real, pelos Ministros Secretários de Estado e pelos Senadores e Deputados;
2.º — Conhecer a responsabilidade dos Ministros e Secretários de Estado.
§ único — Nos crimes cuja acusação não pertencer à Câmara dos Deputados, acusará o Procurador Geral da Coroa.

ARTIGO 62º — Todas as vezes que se houver de proceder a eleições gerais para Deputados, a Câmara dos Senadores será renovada em a metade de seus Membros. Se o número total dos Senadores for ímpar, sairá a metade e mais um.

§ único — Na primeira renovação do Senado decidirá a sorte os Membros que devem sair, e nas subsequentes a antiguidade da eleição de cada um.

ARTIGO 63º — As sessões da Câmara dos Senadores começam e acabam ao mesmo tempo que as da Câmara dos Deputados, excepto quando a Câmara dos Senadores se constituir em Tribunal de Justiça.




CAPÍTULO IV

Da proposição, discussão e promulgação das Leis



ARTIGO 64º — A proposição, discussão e aprovação dos projectos de lei, compete a cada uma das Câmaras.

§ único — As propostas do Poder Executivo, só depois de examinadas por uma Comissão da Câmara dos Deputados, poderão ser convertidas em projectos de Lei.

ARTIGO 65º — Os Ministros e Secretários de Estado podem tomar parte nas discussões das Câmaras, mas somente votarão naquela de que forem Membros.

ARTIGO 66º — Os projectos de Lei, aprovados em uma Câmara, serão remetidos à outra; se esta os não aprovar, ficam rejeitados; se lhes fizer alterações, com elas serão reenviados à Câmara onde tiveram origem.

ARTIGO 67º — Quando a Câmara em que teve origem o projecto não aprovar as alterações, e permanecer todavia convencida da sua utilidade, deverá o projecto ser examinado por uma comissão mista de igual número de Senadores e Deputados.

§ 1.º — Aquilo em que a Comissão acordar, será considerado como novo projecto de Lei, para haver de ser aprovado ou rejeitado por cada uma das Câmaras.
§ 2.º — A discussão do novo projecto começará na Câmara em que teve origem o primeiro.

ARTIGO 68º — Quando ambas as Câmaras concordarem em um projecto de Lei, aquela que ultimamente o aprovar, o reduzirá a Decreto e o submeterá à sanção do Rei.

ARTIGO 69º — Os projectos de Lei sobre impostos e recrutamento, que forem alterados na Câmara dos Senadores, voltarão à dos Deputados; e o que esta definitivamente resolver, será reduzido a Decreto, e apresentado à sanção Real.

ARTIGO 70º — Sancionada a Lei, será promulgada pela fórmula seguinte:

“Dom (F...), por Graça de Deus, e pela Constituição da Monarquia, Rei de Portugal e dos Algarves, etc. Fazemos saber a todos os nossos Súbditos que as Cortes Gerais decretaram, e Nós sancionamos, a Lei seguinte: (A íntegra da Lei nas suas disposições somente.) Mandamos, portanto, a todas as Autoridades a quem conhecimento a execução da referida Lei pertencer, que a cumpram e guardem, e façam cumprir e guardar tão inteiramente como nela se contém.O Ministro e Secretário de Estado de... (o da repartição competente) a faça imprimir, publicar e correr.”



CAPÍTULO QUINTO

Das eleições



ARTIGO 71º — A nomeação dos Senadores e Deputados é feita por eleição directa.

ARTIGO 72º — Têm direito a votar nestas eleições todos os cidadãos portugueses que estiverem no gozo de seus direitos civis e políticos, que tiverem vinte e cinco anos de idade, e uma renda líquida anual de oitenta mil réis, proveniente de bens de raiz, comércio, capitais, indústria ou emprego.

§ único — Por indústria se entende tanto a das artes liberais como a das fabris.

ARTIGO 73º — São excluídos de votar:

1.º — Os menores de vinte e cinco anos: o que não compreende os Oficiais do Exército e Armada de vinte e um anos; os casados da mesma idade, e os Bacharéis formados e Clérigos de Ordens Sacras;
2.º — Os criados de servir: nos quais se não compreendem os guarda-livros e caixeiros que por seus ordenados tiverem a renda anual de oitenta mil réis, os criados da Casa Real que não forem de galão branco, e os Administradores de

Fazendas rurais, e Fábricas;

3.º — Os libertos;
4.º — Os pronunciados pelo Júri;
5.º Os falidos, enquanto não forem julgados de boa-fé.

ARTIGO 74º — São hábeis para ser eleitos Deputados todos os que podem votar, e que tiverem de renda anual quatrocentos mi réis, provenientes das mesmas fontes declaradas no Art. 72º.

§ único — Exceptuam-se os Estrangeiros naturalizados.

ARTIGO 75º — São respectivamente inelegíveis:

1.º— Os Magistrados Administrativos nomeados pelo Rei, e os Secretários gerais deles, nos seus respectivos distritos;
2.º — Os Governadores gerais do Ultramar, nas suas Províncias;
3.º — Os Contadores gerais da Fazenda, nos seus distritos;
4.º Os Arcebispos, Bispos, Vigários capitulares e Governadores Temporais, nas suas Dioceses;
5.º — Os Párocos, nas suas Freguesias;
6.º — Os Comandantes das Divisões Militares, nas suas Divisões;
7.º — Os Governadores Militares das Praças de Guerra, dentro das mesmas Praças;
8.º — Os Comandantes dos Corpos de primeira linha, pelos Militares debaixo do seu imediato comando;
9.º — Os Juízes de Primeira Instância, e os seus Substitutos Súbditos nas Comarcas em que exercem jurisdição;
10.º — Os Delegados do Procurador Régio, nas Comarcas em que exercem as suas funções;
11.º — Os Juízes dos Tribunais de Segunda Instância, e os Procuradores Régios junto a eles, nos Distritos Administrativos em que estiver a Sede da sua Relação.
§ único — Não se compreendem nesta exclusão os Juízes do Tribunal Comercial de Segunda Instância, nem os Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça.

ARTIGO 76º — A metade dos Deputados eleitos por qualquer Círculo Eleitoral, deverão ter naturalidade ou residência de um ano na Província em que estiver colocada a Capital do Círculo: a outra metade poderá ser livremente escolhida de entre quaisquer Cidadãos Portugueses.

§ único — No Círculo Eleitoral que der número ímpar de Deputados, a metade e mais um deverá ter naturalidade ou residência de um ano na Província da Capital do Círculo.

ARTIGO 77.º — Só podem ser eleitos Senadores os que tiverem trinta e cinco anos de idade, e estiverem compreendidos em alguma das seguintes categorias:

1.º — Os proprietários que tiverem de renda anual dois contos de réis;
2.º — Os comerciantes e fabricantes, cujos lucros anuais forem avaliados em quatro contos de réis;
3.º — Os Arcebispos e Bispos com Diocese no Reino e Províncias Ultramarinas;
4.º — Os Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça;
5.º — Os Lentes de Prima da Universidade de Coimbra, o Lente mais antigo da Escola Politécnica de Lisboa e o da Academia Politécnica do Porto;
6.º — Os Marechais do Exército, Tenentes Generais e Marechais de Campo;
7.º — Os Almirantes, Vice-Almirantes e Chefes de Esquadra;
8.º — Os Embaixadores e os Enviados Extraordinários, Ministros Plenipotenciários, com cinco anos de exercício na carreira diplomática;

ARTIGO 78º — Os elegíveis para Senadores podem ser eleitos por qualquer Círculo Eleitoral, posto que nele não residam nem tenham naturalidade,

ARTIGO 79º — São aplicáveis à eleição dos Senadores as exclusões declaradas no Artigo 75º.