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Contos Tradicionaes do Povo Portuguez/Os quatro ladrões

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143. OS QUATRO LADRÕES

Contam as historias antigas que em Roma eram quatro ladrões. E andando huuma nocte a furtar sintirom a Justiça e fugirom e esconderomse em huuma cova. E quando a luz veeo, acharomse em huuma casa de abovada muy fremosa. E acharom em ella huum moymento de marmor muy fremoso. E disserom antre ssy:

— Este moymento foy de algum homem nobre e ryco. Abramollo e vejamos se acharemos hy algum bem. Ca em outros tempos acostumavam soterrar os grandes homens com doas e cousas de grande preço.

Entom abrirom o moymento e acharom o moymento cheo douro e de prata e de pedras preciosas e de vasos e de copas douro muy fremosas. E antre elles era huuma copa muy fremosa e mayor que todallas outras. Quando esto acharom, disserom antre ssy:

— Ora somos nós ricos e de boa ventura, e seremos ricos pera sempre nós e nossos filhos, mas será bem que alguum de nós fosse aa villa per vianda.

E cada huum se escusava, dizendo que era conhecido en a cidade e se temia de o enforcarem. Em cabo disse huum delles:

— Se me vós derdes aquella maior e milhor copa, eu hirey pollo mantimento.

E os outros outorgarom, e elle foy e trouxe de comer. E hindo pello caminho levando a vyanda, cuydou como meteria em ella peçonha em guisa que comendoa seus companheyros morreriam e ficaria delle todo o que acharom en o moymento. E os trez ladrões que ficarom emquanto elle foy fallaromse antre sy e disserom:

— Aquelle era nosso companheiro nom quis hir pollo mantimento senom que lhe dessemos a copa milhor, matemollo e ficará a nós todo o aver.

E disse hum delles:

— Como o mataremos sem perigo, cá elle he mais esforçado ca nós.

Respondeo o outro e disse:

— Quando elle veer digamoslhe que entre dentro e tome a copa e quando se antre dentro tiremos o madeyro que sostem as pedras e cayrom as pedras sobre elle e morrera.

E quando veeo o outro fezeromno assy e ficou logo morto. E elles disseram:

— Comamos e bevamos e depois partiremos o aver antre nós.

E começarom a comer a vyanda que o outro trouxera e morrerom com a peçonha que em ella andava.

(Fl. 105, v.)