Contos Tradicionaes do Povo Portuguez/O firmal de prata

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142. O FIRMAL DE PRATA

Huum barom segral avia grande cobiça de fazer seu pecado com huuma molher. E ella era casta e boa, e porem nom se atrevia elle de a demandar, mas cuydou falsamente e arteyramente como cumpriria sua maa vontade. E tomou huum firmal de prata que era de grande preço e deuho em guarda aaquella molher. E depois furtouo em guisa que o ella nom soube, e lançou o firmal en o mar, por tal que nom lho podendo ella dar, ficasse por sua serva, e assy cuydava husar com ella como lhe prouguesse. E depois que esto fez demandou o firmal aa boa molher. E ella entendeo o engano que lhe fora fecto e acorreusse a huuma sancta virgem que avia nome brigida, e estando con ella veeo huum homem que trazia pexes do mar que elle tirara. E quando abriram hum delles acharom en o ventre delle o firmal, e deuo a boa molher aaquelle homem maao. E assy ficou vaão o seu pensamento e sua arteyrice.

(Fl. 105.)




Notas[editar]

142. O firmal de prata. — O thema da joia engulida por um peixe, persiste na tradição popular (vid. n.º 10); ou engulida por uma aguia (vid. n.º 21). Nas Cantigas de Santa Maria, de D. Alfonso el Sabio, sec. XI, n.° CCCLXIX, tambem se acha esta lenda.