Saltar para o conteúdo

Discurso de Tomada de Posse do Presidente Bernardino Machado (1915)

Wikisource, a biblioteca livre

Senhores:

Saudando deste lugar o meu eminente predecessor, Dr. Teófilo Braga, que deu logo ao Governo Provisório da República o auspicioso prestígio do seu grande nome mundial, apresento ao Soberano Congresso os protestos enternecidos do meu devotadíssimo reconhecimento pela suprema investidura que se dignou outorgar-me, tanto mais honrosa quanto mais grave é o solene momento que atravessamos.

Sem embargo das resistentes dificuldades herdadas, muitas das quais dir-se-iam já irredutíveis, íamos afirmando eficazmente a acção salvadora do novo regime, fórmula fiel do nosso progressivo disciplinamento popular, quando sobreveio a formidável guerra actual — em que terçam armas nações amigas, uma delas mesmo nossa inseparável aliada — abrindo perante nós um período mais que difícil, inquietante para a obra de restauração social que iniciámos.

Não haverá, contudo, provação que possa abater-nos ou humilhar-nos, se, com firme hombridade, pusermos abnegadamente, como nos cumpre, o dever colectivo, que é também o interesse comum, da defesa interna e externa da Nação acima de todas as nossas disputas e contenções divisórias. Comprovemos bem alto o nosso civismo, para que deste penoso lance de ansiedade e de sacrifícios saiamos moralmente robustecidos para melhor prosseguirmos, sem o mínimo desdouro, a realização, tão contraminada pela reaccionária decadência monárquica, do destino inconfundível que a história traçou ao povo heróico, que, colocado na vanguarda da Europa, teve o arrojo imortal de ir, à sua frente, implantar pelo mundo inteiro a definitiva hegemonia da sua civilização.

O acolhimento, de feliz augúrio, dispensado, dentro e fora do país, à eleição presidencial, enchendo-me a mim da mais confortadora gratidão, representa certamente o aplauso geral ao propósito de pacificação política que se viu nela, e, portanto, uma expectativa confiante na inquebrantável solidariedade dos nossos corações patriotas. E essa confiança é um verdadeiro mandato imperativo.

Orgulhosos de o merecermos, com o pensamento em todos os nossos concidadãos de aquém e além-mar, sobretudo naqueles que mais necessitam do carinho e amparo governativo — o povo, a mulher e a criança — conclamemos, com fé ardente, inextinguível, o verbo sagrado que resume esperançosamente os mais nobres anelos da alma nacional:

Viva a República Portuguesa!