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Fausto (traduzido por Agostinho de Ornelas)/XVII

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NA FONTE
 
Margarida. Elisa (com bilhas.)
 
ELISA

Não ouviste dizer nada de Barbara?

 
MARGARIDA

Cous'alguma. Com pouca gente fallo.

 
ELISA

Pois é certo, que a mim Sybilla o disse,
Lá se perdeu em fim. Eis o que fazem
Basofias.

 
MARGARIDA

O que foi?

 
ELISA

Por ahi corre
Que quando come e bebe a dois sustenta.

 
MARGARIDA

Devéras ?

 
ELISA

Teve a sorte que mer'cia;
Pois se não se largavam nem de noite!
Eram passeios, dansas lá n'aldéa,

Ella a ser a primeira em toda a parte,
E de vinho e pasteis a regalar-se.
Mettera-se em cabeça que era linda
E não tinha vergonha de ácceitar-lhe
Presentes. Eram beijos e carícias,
Mas por fim lá se foi tambem a honra.

 
MARGARIDA

Coitada!

 
ELISA

Dó não tenhas! Quando á noite
Ficavamos fiando e vir á porta
Nos não deixava a mãe, ella folgava
Ao-lado do amante; ao pé da entrada,
No banco ou nas escuras alamedas,
Ligeiro lhes corria o doce tempo.
Pois agora que soffra, e vá na Egreja
Penitencia fazer de dó vestida.

 
MARGARIDA

Por mulher elle a toma certamente.

 
ELISA

Não ha de ser tão tolo. Um moço esperto
Em outro logar pode ir divertir-se;
E até já partiu.

 
MARGARIDA

Isso é mal feito.

 
ELISA

Ainda que o apanhe paga-o caro!
Arrancam-lhe os rapazes a capella,
E nós á porta vamos espargir-lhe,
Palha picada.

 
MARGARIDA

Como pude outr'ora
Tão acre censurar, quando uma moça
Se deitava a perder! Como bastantes
Palavras não achava contra as faltas
Dos outros! Eram negras a meus olhos,
E denegria-as mais, e todavia
Denegridas assaz me não par'ciam.
Benzia-me e fazia-me soberba, —
E agora tambem sou peccadora.
Porém, meu, Deus, o que arrastar-me pôde
Ao mal, era tão doce, tão suave!