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Galeria dos Brasileiros Ilustres/Eusébio de Queirós

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Eusébio de Queirós Coutinho Matoso Câmara nasceu aos 27 de dezembro de 1812 em São Paulo de Luanda, ao tempo em que seu pai o conselheiro Eusébio de Queirós Coutinho da Silva ali servia o lugar de ouvidor-geral da comarca. Era este conselheiro casado com sua prima D. Catarina M. de Queirós Câmara. Foi juiz de fora de Benguela, ouvidor-geral de Angola e depois desembargador da Bahia com exercício de ouvidor na comarca do Serro do Frio, então Vila do Príncipe em Minas Gerais, donde foi escolhido em 1821 para ser um dos fundadores da relação de Pernambuco.

Nomeado deputado para as cortes de Portugal, preferiu ir servir naquela relação o lugar de procurador da Coroa por ordem do então ministro José Bonifácio de Andrada e Silva, que lhe votava grande estima em conseqüência da adesão que mostrara aos princípios da independência proclamando as colônias da África, convidando-as a que se separassem de Portugal para se unirem ao Brasil. Em 1825 veio tomar assento como desembargador agravista na Casa da Suplicação: em 1827 foi nomeado desembargador do Paço e chanceler governador das justiças na relação da Bahia, onde regressou para o Rio de Janeiro em 1828 por ser da primeira organização do Supremo Tribunal de Justiça.

Seu filho quinto de nascimento, mas primogênito dos dois únicos que escaparam ao clima deletério da África portuguesa, veio para o Rio de Janeiro contando três anos de idade: tinha seis anos quando, levado ao Serro do Frio, aprendeu ali as primeiras letras; em 1822 aprendeu latim em Pernambuco com o padre Francisco do Rego Barros; em 1826 e 1827 freqüentou o seminário de São José, estudando filosofia racional e moral com o padre mestre Fr. Peres, retórica e grego com o padre mestre Fr. Custódio de Faria. Este professor fazia do seu discípulo tal conceito que no atestado de prêmios, os seus mesmos condiscípulos proclamariam que a ele competia. Em 1828 repetia na Bahia a aula de retórica quando se abriu o curso jurídico de Olinda, para onde foi remetido em companhia do primeiro lente daquela Academia e seu diretor interino, o desembargador Lourenço José Ribeiro.

Seu exame de latim foi por onde começou a nova academia, assim como foi o primeiro estudante que se habilitou para nela se matricular. Tinha acabado de fazer 15 anos, teve por condiscípulos homens feitos e alguns dos que mais se têm distinguido. Entretanto coube-lhe a honra de ser premiado com o atual bispo do Rio de Janeiro, o Sr. Conde de Irajá, que já era sacerdote e lente de teologia moral no seminário de Olinda. Foi premiado ou proposto a prêmio em todos os quatro anos desse curso em que houvera prêmios. Fechada a Academia antecipadamente pelas perturbações de 1832, fez ato e tomou o grau de bacharel formado no mês de setembro, e aos 20 de outubro chegou ao Rio de Janeiro para a companhia de seu pai, que então servia no Supremo Tribunal de Justiça; aos 9 de novembro foi nomeado juiz do crime do bairro do Sacramento nesta corte, lugar que começou a servir como juiz de fora no dia 24 de novembro de 1832. Ia fazer 20 anos em 27 de dezembro!

Em 19 de março de 1833 foi nomeado juiz de direito chefe de polícia da Corte contando, como se vê, muito menos de 21 anos. A época era melindrosa: filho de um homem que se ocupava exclusivamente dos seus deveres como magistrado, e que se conservava sempre estranho à política, o filho continuou na mesma vereda até o ano de 1840. Em 1835 casou-se com a Srª D. Maria Custódia Ribeiro de Oliveira Queirós, filha legítima do abastado capitalista e comendador Manuel José Ribeiro de Oliveira, já então falecido, e de sua mulher D. Engrácia Maria da Costa Ribeiro, filha do tenente-coronel Manuel José da Costa, a qual é hoje a Srª Condessa da Piedade por ser viúva em segundas núpcias do Conselheiro de Estado José Clemente Pereira. Ocupou o lugar de chefe de polícia desde março de 1833 até o mês de abril de 1844 com uma ligeira interrupção de 5 meses em 1840.

Em março de 1842 foi nomeado desembargador da Relação do Rio de Janeiro, continuando no exercício de chefe de polícia: apenas pois obteve a demissão desse cargo, continuou a servir na Relação até maio de 1848, em que da Câmara dos Deputados passou a ocupar o Ministério da Justiça, em 29 de setembro de 1848, onde se conservou até maio de 1852. Em 1838 foi eleito deputado à Assembléia Provincial, e logo um dos primeiros; em 1840, apesar de candidato da oposição, obteve o 5º lugar entre os deputados do Rio de Janeiro para a Câmara dissolvida em preparatórias no ano de 1842. Reeleito na de 1843, serviu nela até 1844, em que foi também dissolvida discutindo-se o voto de graças de que fora relator, tendo previamente pedido e obtido demissão de chefe de polícia.

Voltou à Câmara dos Deputados em 1848, donde saiu, como vimos, para o Ministério; reeleito daí em diante, constantemente foi eleito e escolhido senador em 1854. Quando em março de 1833 entrou para o cargo de chefe de polícia, esse cargo não tinha atribuições; não podia dar uma busca, e até havia quem lhe contestava o direito de ordenar prisões; a consignação para a polícia apenas era para pagar a secretaria e deixava menos de dois contos anuais para eventuais. Eis como se exprime o relatório de Sr. Marquês de Palma em 1833: "O chefe de polícia está quase limitado a transmitir notícias aos juízes de paz, e a recebê-las dele para as comunicar ao governo". É fácil portanto ajuizar que o chefe de polícia é quase um nome vão que não serve senão para comprometer o magistrado que o tiver. O público, fácil de iludir-se com os nomes, quer exigir deles os mesmos serviços que recebia do intendente-geral da polícia, mas ele de fato nenhuns serviços poderá prestar, e para disso nos convencermos basta ponderar que não tem jurisdição para passar um só mandado e busca, um só mandado de prisão.

Entretanto, a cidade estava inçada de ladrões que atacavam as casas mesmo nas ruas mais freqüentadas da cidade como Ourives, Quitanda, Ouvidor, etc. Pedro Espanhol era seu chefe, que espalhava o terror, mas passeava impunemente: as fábricas de cobre trabalhavam até na Rua do Cano! A atividade da polícia apreendeu em 1833 dentro de poucas semanas mais de seis fábricas, uma delas em tão grande escala, que excedia em alguns misteres à Casa da Moeda. Pedro Espanhol foi preso depois de resistência, que o deixou tão ferido que em alguns dias morreu; sua quadrilha foi dispersada, indo a maior parte para as galés, sendo o seu último feito o ataque da ilha da Caqueirada, onde foi arruinado o infeliz liberal: pagaram quatro com a pena última o seu arrojo: algumas dezenas de seus sócios foram purgar nas galés seus atentados. O Tesouro foi roubado; mas a perseverança da polícia conseguiu em alguns meses reaver quase todo o roubo, prender os salteadores, e se todos não pagaram suas culpas, dependeu isso do júri de Niterói, então de escandalosa celebridade. Diligências importantes sobre o papel-moeda descobriram as fábricas até mesmo em Portugal, onde se encontraram provas e fábricas por indicações feitas pela polícia do Rio de Janeiro.

Já em 1836 assim se exprimiu o Sr. Limpo, visconde de Abaeté, no seu relatório: Só uma atividade que não cansa, um zelo que não desmaia, podem explicar algumas importantes diligências que se têm feito nesta Capital. Além das prisões de muitos facinorosos, apreendeuse, no mês de dezembro do ano próximo passado, a um francês cerca de 90 contos de réis em notas falsas. A fábrica foi vigiada constantemente pela polícia por espaço de mais de um mês, e a apreensão das notas efetuou-se precisamente na ocasião em que elas iam ser introduzidas na circulação. Uma diligência delineada com tanta perspicácia, seguida com tanta perseverança e executada com tão feliz resultado, fazia honra à polícia mais bem montada.

No Senado, o marquês de Barbacena exaltava a nova atividade da polícia na Câmara dos Deputados, os membros de partidos opostos elogiavam o jovem chefe de polícia. O Sr. Vasconcelos, então ministro, Marinho, Otôni e Limpo, de idéias inteiramente opostas, o elogiavam. O júri chegou a ter onze sessões anuais, das quais oito presididas pelo chefe de polícia para pôr em dia processos atrasados desde 1808! Em 1833, em dezembro, houvera os distúrbios da Sociedade Militar; o chefe de polícia então em nulidade em política não era nem eleitor; as ordens eram transmitidas diretamente aos juízes de paz; nestes dias ele nem teve a disposição da força da polícia; o ministro mandou prender o juiz, encarregando a direção ao juiz de paz da Glória, João da Silveira do Pilar; o chefe de polícia inspirava tão pouca confiança em política que só foi informado do que se fazia depois de tudo feito. O ministro procurou substituí-lo; e chegou a oferecer ao Sr. Paulino (visconde de Uruguai) esse lugar, o que não foi aceito; e como as questões políticas cessaram, tomando as deliberações todas o ministro com os juízes de paz, e no mais o chefe de polícia agradou e foi conservado.

Do tempo do ministério os fatos são muito recentes e públicos. Da vida parlamentar o mesmo.