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Galeria dos Brasileiros Ilustres/Marquês de Paraná

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Marquês de Paraná
Marquês de Paraná

Honório Hermeto Carneiro Leão, Marquês de Paraná, nasceu na Província de Minas Gerais, Vila de Jacuí em 11 de janeiro de 1801; era filho legítimo do coronel Nicolau Neto Carneiro Leão e de sua primeira mulher, D. Joana Severina Augusta Lemos. Partiu em 1820 para a Universidade de Coimbra, onde tomou o grau de bacharel em Direito no ano de 1825. Nomeado juiz de fora de S. Sebastião em 1826, serviu depois diversos lugares de magistratura, como os de auditor de marinha e ouvidor do Rio de Janeiro, e no fim de três ou quatro anos de exercício foi elevado ao cargo de desembargador de Relação de Pernambuco com exercício na desta corte. Na ocasião em que devia entrar para o Supremo Tribunal de Justiça, como lhe vedasse pela lei a sua qualidade de conselheiro de estado, aposentou-se. Percorreu por conseguinte na carreira da Magistratura todos os cargos e todas as honras, faltando-lhe unicamente o último degrau de hierarquia judiciária, que não atingiu, porque já então o estadista dominava o magistrado: o homem político fazia desaparecer o juiz.

Foi eleito deputado por Minas à segunda legislatura, que começou a funcionar no ano de 1830. Honório Hermeto Carneiro Leão ligou-se ao partido moderado; apesar de não ser orador, a sua atividade e energia, a sua dialética cerrada o distinguiram logo entre os seus colegas Chegou finalmente o memorável dia 30 de julho de 1832, uma das datas mais célebres do Brasil: não entraremos no alcance político dos acontecimentos que então se passaram, deixando que a posteridade julgue de que lado estava a razão e a justiça. Apesar de haver aderido ao plano de convenção, H. H. Carneiro Leão apresentou-se na sessão de 30 de julho resolvido a combatê-lo; separou-se de seus antigos aliados, e pronunciou-se com tanta firmeza e energia contra o projeto, que conseguiu produzir na maioria um fracionamento, que, ligando-se à oposição, suplantou o partido moderado, e rejeitou a idéia da reforma constitucional. Deste fato data propriamente a influência de H. H. Carneiro Leão; sua decisão, o seu pronunciamento franco e enérgico, e sobretudo o feliz resultado de que foi coroada sua iniciativa, o colocaram imediatamente à frente do novo partido que havia organizado, porque era de fato um novo partido este que se havia formado da fusão dos oposicionistas com os liberais divergentes.

Tornou-se pois o homem da situação, e depois do famoso Ministério de Quarenta Dias, foi chamado para fazer parte do gabinete de setembro em que ocupou a pasta da Justiça. Contava então pouco mais de trinta e um anos: seu caráter independente, que se havia revelado bem claramente no curto espaço de sua vida política, tornou-se ainda mais notável no ministério; desde o começou declarou que não aceitaria imposições, nem governaria por direções estranhas. Era ainda muito moço na vida e na política para que seus antigos chefes se resignassem a ceder-lhe o primeiro lugar e a trabalhar sob as suas vistas; daí proveio uma divergência entre o novo inistro da Justiça e os homens que dirigiam a onipotente maioria. Assim, apesar da situação que ele criara, e que elevou ao poder os homens da maioria, foi repelido por eles; e o ódio político dos seus antigos aliados chegou a tal ponto que reuniram os eleitores mineiros para cassarem o diploma do homem que acabava de obter a mais brilhante reeleição. Nem por isso H. H. Carneiro Leão renunciou às suas opiniões de liberalismo moderado, e quando em 1834 a morte de D. Pedro I, aniquilando as esperanças de uns e os receios de outros, destruiu a barreira que dividia os antigos partidos, o seu talento deu-lhe uma posição eminente nesta Câmara poderosa, que obrigava a retirar-se da regência o homem que ela mesma elevara.

Organizou-se então o célebre gabinete de 19 de setembro de 1837; e nesta ocasião deu H. H. Carneiro Leão uma prova de sua penetração de homem político: desdenhando o prestígio de uma pasta, preferia conservar-se na Câmara como chefe da maioria, e dominar o ministério desta posição respeitável que o seu talento e a sua influência então decisiva lhe asseguravam. Iniciando-se em 1840 o projeto da maioria, combateu-o apresentando outro com uma reforma da Constituição; repentinamente porém o retirou sem prévio acordo com o gabinete, talvez por uma dessas resoluções prontas e decisivas, que o seu espírito previdente e a sua firmeza de vontade lhe faziam tomar muitas vezes. Deste fato resultou a indecisão que mostrou o Governo do regente nesse período, e a lei que declarou a maioridade e inaugurou o reinado atual em 23 de julho de 1840. A mudança de política que então se deu colocou-o na oposição, onde sob uma fase diferente teve ainda ocasião de dar provas de sua firmeza e atividade: naqueles tempos em que a oposição não era, como hoje, um simples descontentamento, mas uma luta tenaz e constante, o seu espírito revelou todos os recursos de um hábil político.

Com a entrada do Ministério de 1841 recuperou a sua posição de chefe da maioria, e distinguiu-se como presidente do Rio de Janeiro, combatendo a rebelião de 1842, e foi nessa época nomeado senador e conselheiro de Estado: a província ainda conserva a lembrança dos benefícios que deve à sua administração vigorosa. Sendo encarregado de organizar um novo Ministério em 20 de janeiro de 1843, ocupou nele a pasta da Justiça, e depois a de Estrangeiros, até fevereiro de 1844, em que fez aparecer a questão de gabinete que mudou novamente a política do país. Voltou então à oposição, e nela manteve-se sempre firme até a elevação do Ministério de 29 de setembro de 1848, ao qual prestou serviços relevantes com a sua presidência de Pernambuco em 1849, e com a sua missão ao Rio da Prata em 1851. Teve o oficialato da Ordem do Cruzeiro em 10 de agosto de 1841 e a Grã-Cruz de Cristo em 18 de março de 1851. Carta real de S. M. D. Pedro V de Grã-Cruz da Real Ordem Militar portuguesa de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa, em 26 de janeiro de 1856, carta imperial de Visconde de Paraná em 10 de julho de 1852, e de marquês do mesmo título em 5 de dezembro de 1854. Quando, em 5 de setembro de 1853, o Visconde de Paraná foi chamado para a organização de um novo Ministério, a política do país, essa política que desde 1830 tinha dominado inteiramente o espírito público, estava de todo gasta.

A luta, que durante tantos anos havia animado com a sua agitação febril as questões de governos e administração, desaparecia, deixando após si a reação, e com ela o letargo de todas as paixões políticas, a descrença nos poucos princípios que haviam servido de normas e de programa às diversas opiniões. Um dos dois partidos enfraquecidos, decomposto, sem harmonia e sem ligação, havia tudo perdido, até o nome que o distinguia; alguns homens notáveis pela influência passada, restos de um grande núcleo, lembravam ainda, como hoje, esses liberais ilustres que haviam dirigido os negócios do país durante os primeiros anos de sua organização, e inaugurado por uma revolução legal o reinado atual. O último Ministério do Marquês de Paraná é a história contemporânea que todos conhecem. Ele realizou o grande pensamento da conciliação proclamado do alto do Trono e foi o iniciador de uma nova política.

Faleceu no dia 3 de setembro de 1856, sendo presidente do Conselho, ministro e secretário de Estado dos Negócios da Fazenda, senador do Império, conselheiro de Estado, ministro do Supremo Tribunal de Justiça, oficial da Ordem do Cruzeiro, Grã-Cruz de Cristo, da Águia Branca da Rússia, da Ordem Militar da Conceição de Vila Viçosa, provedor da Santa Casa de Misericórdia.