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Horto (1910)/Ao clarão da lua

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AO CLARÃO DA LUA


A meu irmão Eloy



O LIRIO

Lá nas alturas, modesta e loura,
— Do Céo immenso na face núa —
A lua branca todo o Azul doura...

A NUVEM

Ah! si eu podesse mudar-me em lua!

O PERFUME

E aquella estrella, tão pequenina
Que mal a gente consegue vel-a ,
Como scintilla, casta e divina!

A LUA

Ah! quem me dera ser uma estrella!

A NUVEM

O lirio branco, cheio de orvalho,
Invoca a lua no seu martyrio
E doce e triste treme no galho...

A ESTRELLA

Ah ! quem me dera ser como o lirio!

O CÉO

Perfume doce boia nos ares...
Virá nas azas de um vagalume?
Será da terra? Será dos mares?

O ORVALHO

Ah! quem me dera ser o perfume!

O POETA

Terno instrumento suspira ao longe
N’uma cadencia melodiosa...
Será na cella piedoso monge?

UMA CREANÇA (sonhando)

Ah! quem me dera ser uma rosa!

A NOITE

O sonho vive dentro em meu seio,
Garrulo e meigo, doce e risonho,
Cheio de luzes, de aurora cheio...

O PERFUME

Ah! quem me dera ser como o Sonho!

A MADRUGADA (ao longe)

Ouvem? As aves ja vêm cantando,
As estrellinhas tomam seu véo...
E’ tempo de irmos tambem chegando...

O CORAÇÃO

Ah! quem me dera subir ao Céo!

Janeiro de 1897.