Os olhos não mentem

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Não sei se acredite — se vá duvidando
Que os olhos não mentem, não mentem sei eu.
Mas lingua da terra, na terra fallando
Não podem dizer-me taes coisas do céu.

Os olhos não mentem que são a voz d′alma,
Singello, — o que sente nos olhos o diz —
Ou sonhe venturas gozando da calma
Ou gema saudades, chorando infeliz.

Se um dia procuram guardar um segredo
Coitados dos olhos que tentara mentir
Que logo em castigo, que logo de medo,
Rebenta dos olhos o pranto a cahir.

Os olhos não mentem, é tempo perdido
Por mais que o repitam, não mentem, sei eu,
Mas linguas da terra só fallam fingido
Tentando dizer-me taes coisas do céu.


Lisboa, 1848.