Página:ÁlbumDeBelém1902.pdf/8

Wikisource, a biblioteca livre
ESCUDO MUNICIPAL

investigação, peccam por ambiguas. Houve sem duvida deturpações das phrases primitivas.

Vereat æternum é uma phrase incorrecta; não ha verbo algum latino que possa affectar a forma vereat; a inscripção deve ter sido: Ver eat æternum. Caminhe a primavera eterna.

Por baixo do cesto com fructas lê-se: Futius latent. Escondem-se com mais segurança.

Basta uma confrontação, d’estes dizeres para resaltar a ambiguidade do sentido; o que, porém, está bem claro é a allusão á eterna primavera dos tropicos, á fructificaçâo quasi que constante das nossas arvores; os cestos com flores e fructas symbolisam a fertilidade do solo, a pujança da vegetação.

A inscripção Rectior cum retrogradusCaminha melhor quando retrogrado, — afigura se-nos de difficil explicação, especialmente pela circunstancia de caminhar o sol do occidente para o oriente.

Suppor que o sol symbolisa a civilisação americana, reverberando do novo continente para o velho, parece-nos uma interpretação incompativel com as idéas d’aquelles tempos. O castello com as quinas encerram talvez uma allusão ao poderio das armas portuguesas. O boi e a mula devem representar a industria pastoril, que tanto prosperou no Estado; a inscripção, entretanto, nada adeanta sobre o caso.

Nequaquam minima estDe modo algum és amenor — E'mais provável que taes dizeres refiram-se antes á cidade que áquella industria.

No evangelho de S. Matheus, cap. II, v. 6, cita-se a prophecia de Michéas, a respeito da cidade de Belem (onde nasceu Christo), do modo seguinte:

«E tu, Bethlem, terra de Judá, nequaquam minima es in principibus Juda: ex te enim exiet dux, qui regat populum meum Israelis» — E tu, Belém, terra de Judá, nao és a menor (isto é, a de menos consideração), entre as principaes de Judá, porque de ti sahirá o conductor que ha de commandar o meu povo de Israel.

Bem pode ser que haja analogia entre a inscripção Nequaquam minima est e esta prophecia; dizer que a cidade recem fundada não seria a menos importante entre as do Brazil era affirmar uma verdade que o futuro incumbiu-se de demonstrar.

A pobreza do nosso archivo colonial no periodo de 1616, anno da fundação de Belem, e 1681, data dos mais antigos documentos da Iº o secção de manuscriptos da Bibliotheca e Archivo Publico do Estado, consequente de um naufragio do secretario José Duarte Cardoso, em 1726,[1] impede noticias mais claras sobre o escudo municipal.

  1. V. Annaes da Bibliotheca e Archivo Publico do Pará. Tomo I Doc. 177. Pag. 239.