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A esperança

 


Ah! de meus progenitores
Foste a desgraça, o tormento;
Vai! e que entre os condemnados
Não tenhas paz um momento!

Tu foste da minha Olinda
O cruel, vil roubador;
Tiraste-me mais que a vida
Levando-me o meu amor!..

Assassinaste meu pae!
Minha mãe morreu de dor!
E para os vingar, ousado,
Fugi longe ao teu furor!

Familia, amor, riquezas,
Tudo, cruel, me usurpaste;
Quanto à vida me prendia,
Homem traidor, me roubaste!

Disfarçado em pobre monge
Os passos teus vigiava,
E da vingança o momento
Opportuno eu esperava.

Esse instante alfim chegou;
O disfarce meu deixei,
E qual tigre enfurecido,
Minha raiva em ti cevei!

Logo após fugi dos homens,
Deixando um mundo perverso,
E só, entre a natureza,
Vivo em magoas submerso!..

 



E n'um virente cedro magestoso,
O joven triste, a lyra pendurou,
E de gemer cançado, sobre a relva,
Ao somno por instantes s'entregou.

E nas feições do Bardo adormecido
Notava-se alma paz, meigo sorriso;
Era sonho fagueiro, mentiroso
Que a mente lhe encantava d'improviso.

Levanta-se dormindo, e contra o seio,
Imagina estreitar alguem que amou;
Tal impressão sentiu mesmo sonhando
Que exultando d'amor, logo acordou.

Na solidão, alem os olhos lança.
A visão já buscando, o amor, a vida;
Quer ao sonho dar fé, quer illudir-se
E foi n'alma uma esp'rança inda nutrida.

 
 
A um joven pintor brazileiro
 
 

Não me enganava, não. Em tua fronte
Crestada pelo sol, eu li poemas
De ardente inspiração!
Não me enganava, não. A tez morena
Do filho dos sertões é claro espelho
D'um nobre coração.

Anima-te, pintor! Pinceis na dextra
E a téla que nos mostre os vastos mundos
Do teu scismar febril.
Anima-te, pintor! Que a Europa saiba
Que os genios da pintura tambem fulgem
No solo do Brazil.

Filho do Parahyba, encara a patria!
Que rica inspiração! As matas virgens
Do teu paiz natal,
A cachoeira veloz, os altos halsamos,
E as frondosas craibeiras dão mil tintas
Para um quadro immortal!

Filho do Parahyba, surge! E tempo!
Logar a um genio do Brazil, distincto!
Artista, qual tu és,
Tens na patria um futuro: terás cultos,
E as cordas da gloria hão-de, pomposas,
Cahir sempre a teus pés.

A hordo do vapor Guienne.
12 de setembro de 1864.