Página:A Esperanca vol. 1 (1865).pdf/4

Wikisource, a biblioteca livre
4
A esperança

 


O Bardo na solidão

por

Maria Adelaide Fernandes Prata

Sentado a meditar sobre um rochedo,
Inda joven o Bardo suspirava,
Macilentas as faces e encovados
Os bellos olhos tinha que n'outr'ora
Revelaram d'amor paixão mui terna.
De repente expressão feroz, medonha,
Ao rosto lhe assomou tornando-o rubro
E momentos após, sorriso ironico,
Sorriso indecifravel e terrivel
Que d'alma traduzia o fel, angustia,
Nos labios resequidos se mostrava!
Ergue-se o mal-fadado e frias gotas
Da fronte lhe dimanam incendida,
Vagueando ora aqui, alli errante,
A descançar o forçam dor, fadiga!
D'um passado feliz reminiscencias,
O rosto lhe humedecem d'agro pranto;
Tomando então a lyra luctuosa,
Aos ventos solta em vão as queixas suas.

Bardo

Ah! bem cedo exp'rimentei
D'este mundo o vil engano;
Bem cedo traguei o fel
Das paixões no desengano!..

Sim; nasci para o martyrio,
Para chorar e soffrer,
E sem 'sp'rança de conforto,
Talvez sceptico morrer!..

A fé, venturas, amor,
O mundo roubou d'est'alma,
Tirou-lhe os gozos da vida
E até da gloria a palma!..

Eu era bom, innocente,
Cria nos homens e em Deus,
Cria em amor e ventura
E lhes dava affectos meus;

Mas dos homens a maldade,
O egoismo, a traição,
Accenderam da vingança
O fogo no coração!

Pediu um crime, outro crime;
Paguei affronta co' affronta
E cravei n'um peito indino,
D'um punhal aguda ponta!..

 

Melancolia

 

A minha irmã Amelia Augusta

Vès como as folhas que o nordeste embala
Pallidas, murchas vão cair no chão?.
Taes minhas crenças que a desgraça abala,
Uma após outra dispersadas são!

Não vês no occaso desmaiar o dia,
Envolto em sombras de nublado ceu?
Assim no rosto que p'ra ti sorria,
Desceu funério, pensativo veu..