Página:A Esperanca vol. 1 (1865).pdf/79

Wikisource, a biblioteca livre
A esperança
79

 


Bardo

E que destino déste à minha Olinda?
Que fizeste cruel da malfadada?..
Ah! do seu coração inteira posse,
Na terra eu só gosava e ninguem mais!

Era a luz d'esta vida, o meu amparo,
Era o meu universo, o céo, a gloria!
Sem ella fiquei só, qual massa inerte,
Ao acaso, no mundo vagueando!..


Astros

O'! pallidos prophetas, ó! tristes pensadores,
Vós que passais na terra juncada d'esplendores
C'os olhos, onde estrellas se vêem resplandecer,
Fitos em horisontes que ninguem pode vér!
O sol, n'outro hemispherio vai os fulgores mostrar!
«Cai além um diluvio dos reflexos do dia,
«Em quanto aqui é noite densa, escura e'sombria,
«Assim, quando nos cerca da morte o escuro véo,
«Nós somos esses astros que vão brilhar no ceu!..
Oh! pallidos prophetas, qual é o vosso caminho?
Cysnes, que andais sósinhos longe do patrio ninho,
Em busca das auroras, das brisas da manhã;
Abelhas que os licôres exhauris da romaa,
Dos lyrios e das rosas; que sorveis os perfumes,
Que a vossa mãe Psyché vos dá; quando esses lumes,
Que à noite, scintillando sobre os ethereos véos,

Vos dizem o caminho das phalanges de Deus,
Atravessais a terra, sempre a cantar um hymno!..
Sublimes pensadores, qual é o vosso destino?

«Quando p'ra nós s'esconde, nos abysmos do mar
«O sol, n'outro hemispherio vai os fulgores mostrar!
«Cai além um diluvio dos reflexos do dia
«Em quanto aqui é noite densa, escura e sombria
«Assim, quando nos cerca da morte o escuro véo,
«Nós somos esses astros que vão brilhar no ceu!..

Novembro de 1864.

Pedro Augusto de Lima.

Viver á sombra

Desenrola os teus cabellos,
Essas lindas tranças d'oiro,
Deixa-os cair soltos, bellos,
Ao desdem, meu anjo loiro,

Deixa que essa alva cambraia
Cubra o seio virginal,
Como a neblina na praia
Cobre do mar o crystal...

Depois foge e yem deitar-te
Na macia e verde alfombra,
Arrollando, hão-de embalar-te
As tristes ayes da sombra.

E n'essa relva mimosa,
Que assombreia o velho alamo,
Verás tu, púdica rosa,
O nosso singelo th'lamo...

E o mar o orgão canoro-
Da esplendida naturesa
Então cantará sonóro
Hymno d'amor e tristeza...

E nós á luz do luar
Dormiremos sobre a alfombra...
E os anjos hão-de cantar
Nosso noivado na sombra...

Alberto Pimentel .