Página:A Esperanca vol. 1 (1865).pdf/83

Wikisource, a biblioteca livre
Eremita

A sorte como tu d'Olinda ignoro:
Quando do pae ouviu ordens indinas,
Quando por elle viu tão mal cumprida
A palavra d'um nobre cavalleiro
E d'honra fementidas as promessas,
Representa-lhe humilde e com brandura
A infamia a que seu nome alto s'espunha;
Porém o pae irado e inflexivel,
A donzella repete ordens crucis,
Forçando-a a ob'decer, seguir seu mando.
De noiva ricas galas the prepára
E adereços luzidos d'alto preço;
Com arte e gosto adornam-se aureas sallas
Preparam-se festins, grandes fulgares;
Na capella os brandões já refulgiam,
E de Deus o ministro, ante os altares,
O momento aguardava de formar
P'hymeneo, a sagrado laço puro;
Porém, faltava Olinda, onde está ella?!
Em vão na estancia sua a buscam todos,
Buscaram-na de balde em toda a parte!..
Então a compaixão, remorso e magoas
Senti no coração a yez primeira
E em lagrimas e ais me arrependia
Dos males que perverso originára!
O que então se passon dentro em minh'alma,
Difinil-o não sei!,, só o sentia...
Horrores que o inferno aos condemnados,
Terrivel the prepára enfurecido,
No peito angustiado eu os soffria!...
Livre-te o céo, ó Bardo de sentires
O remorso cruel, o meu martyrio!...

E já d'aurora as lagrimas se uniam
A's do velho contricto, moribundo
Que do Bardo o perdão só anhelava,
Por derradeira graça cá no mundo.
O mancebo se prostra e commovido
Ergue os olhos ao céo, vai perdoar,
Não sente já furor, odio, vingança
E junto do eremita foi orar.

Eremita

Ah! que pura alegria eu sinto, ó filho!
Dos labios teus o meu perdão ouvindo!
Cumpridos são, Sabino, os meus desejos,
Da terra nada mais ambiciono!
Mensageiro de paz, fizeste n'alma
De Paraiso a esp'rança renascer;
Os passos teus aqui guiou o Eterno,
Para me assegurar da gloria a palma!..
O' Deus incomprehensive!! teus arcanos,
Não é dado aos mortaes fracos sondarem!..
Sabino. . Adeus... eu sinto já da vida
Abandonar-me e extinguir-se o sopro!..
Ah! roga a Deus por mim, que lá nos céus,
Attendidas serão as preces tuas...
E o grande peccador tão criminoso,
Após austéra vida penitente,
Qual justo feneceu, arrependido,
Tendo o seu Deus, a fé sempre na mente,

Ah! o Bardo scismando pensa ainda
Que um sonho fora tudo, uma illusão;
E como acreditar que o seu tyranno
Houvesse d'estreitar ao coração!..

Como ver-lhe pendida a fronte exhausta
Sobre o peito que outr'ora enfurecido,
Contra elle nutriu odio, vingança!
E dar-lhe hoje o perdão, enternecido!

Curva-se em oração n'esse logar,
Pelas lagrimas já santificado