dos ovos. A fêmea fica com o trabalho de botá-los, mas o macho tem que tomar conta deles.
— Mas assim os ovos não chocam — objetou a Razinha. — Para que choquem é preciso que as fêmeas fiquem uma porção de dias sentadas sobre eles. As galinhas levam 21 dias no choco.
— Já "previ a hipótese" — disse Emília e reformei esse ponto. No meu sistema de passarinho-ninho quem choca não é a fêmea e sim o sol, como acontece com os ovos dos jacarés, tartarugas, lagartixas e cobras.
— E quando não houver sol? As vezes se passam dias sem o sol aparecer.
— Nesse caso, os ovos que tenham paciência e esperem que o sol apareça. Para que pressa?
A Rã não teve mais nada a dizer. Estava certo. Só então é que Emília se lembrou de cumprimentá-la e saber como iam todos lá da casa. Também lhe examinou as mãos para ver se as unhas estavam de luto. E fê-la voltar-se de perfil e de costas, e dar três pulos. Era a primeira vez que as duas se encontravam pessoalmente.
— Estou gostando do seu fisico — disse Emília no fim do exame. — Tive medo de que não correspondesse à idéia que fiz. Muitas vezes a gente imagina uma pessoa e sai o contrário. Gostei muito da sua última carta sobre a reforma das cidades e das gentes. Adoro você, Rã, porque você não concorda.
— Ah! não concordo mesmo! — exclamou a Rãzinha. — Vivo não concordando. Em nós, gente, por exemplo, quanta coisa errada! Por dois olhos na frente e nenhum na nuca? Eu, se fosse reformar as criaturas, punha um olho na testa e outro na nuca. Desse modo eu dobrava a segurança das criaturas.
— Pois eu aumentava o número de olhos — disse Emília. — Por que dois só? Assim como temos dez dedos podíamos ter dez olhos. Eu punha quatro na cabeça, a norte, sul, leste e oeste. E punha dois nos dedões dos pés, para evitar as topadas. Outro dia Pedrinho deu uma topada num tijolo que quase arrancou a unha. Com um olho em cada dedão, não há perigo de topadas — nem de espinhos e estrepes. E eu também dava olhos a cada dedo minguinho. O minguinho é um verdadeiro vagabundo nas mãos. Não faz nada. Fica o tempo todo assistindo ao trabalho dos outros. Ora, se o "mingo" tivesse um olhinho na ponta, podia prestar bons serviços. As vezes a gente quer enxergar numa cova de dente ou ver se há cera no ouvido e não pode. Com o olho do "mingo", nada mais fácil.