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A CIDADE E AS SERRAS

fortes ou lânguidos, o interior das suas almas. Não lhe apeteceu nenhuma dessas mil almas — e recuou, desconsolado, até aos Biólogos... Tão maciça e cerrada era a estante de Biologia, que o meu pobre Jacinto estarreceu, como ante uma cidadela inacessível! Rolou a escada — e, fugindo, trepou, até às alturas da Astronomia: destacou astros, recolocou mundos; todo um Sistema Solar desabou com fragor. Aturdido, desceu, começou a procurar por sobre as rimas as obras novas, aindas brochadas, nas suas roupas leves de combate. Apanhava, folheava, arremessava; para desentulhar um volume, demolia uma torre de doutrinas; saltava por cima dos Problemas, pisava as Religiões; e relanceando uma linha, esgravatando além num índice, todos interrogava, de todos se desinteressava, rolando quase de rastos, nas grossas vagas de tomos que rolavam, sem se poder deter, na ânsia de encontrar um Livro! Parou então no meio da imensa nave, de cócoras, sem coragem, contemplando aqueles muros todos forrados, aquele chão todo alastrado, os seus setenta mil volumes — e, sem lhes provar a substância, já absolutamente saciado, abarrotado, nauseado pela opressão da sua abundância. Findou por voltar ao montão de jornais amarrotados, ergueu melancolicamente um velho Diário de Notícias, e com ele debaixo do braço subiu ao seu quarto, para dormir, para esquecer.

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