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A CIDADE E AS SERRAS

Senti dentro o sorriso superior de Jacinto :

— Ah, é o coronel Dorcas... Lições de Metafísica Positiva sobre a Quarta Dimensão... Conjecturas, uma maçada! Ouve lá, tu hoje jantas comigo e com uns amigos, Zé Fernandes?

— Não, Jacinto... Estou ainda enfardelado pelo alfaiate da serra!

E voltei ao gabinete mostrar ao meu camarada o jaquetão de flanela grossa, a gravata de pintinhas escarlates, com que ao domingo, em Guiães, visitava o Senhor. Mas Jacinto afirmou que esta simplicidade montesina interessaria os seus convidados, que eram dois artistas... Quem? O autor do Coração Triplo, um Psicólogo Feminista, de agudeza transcendente, Mestre muito experimentado e muito consultado em Ciências Sentimentais; e Vorcan, um pintor mítico, que interpretara etèreamente, havia um ano, a simbolia rapsódica do cerco de Tróia, numa vasta composição, Helena Devastadora...

Eu coçava a barba:

— Não, Jacinto, não... Eu venho de Guiães, das serras; preciso entrar em toda esta civilização, lentamente, com cautela, senão rebento. Logo na mesma tarde a electricidade, e o conferençofone, e os espaços hipermágicos e o feminista, e o etéreo, e a simbolia devastadora, é excessivo! Volto amanhã.

Jacinto dobrava vagarosamente a sua carta, onde metera sem rebuço (como convinha à nossa fraternidade) duas violetas brancas tiradas do ramo que lhe floria o peito.

— Amanhã, Zé Fernandes, tu vens antes de almoço, com as tuas malas dentro dum fiacre,

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