Página:A escrava Isaura (1875).djvu/231

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A situação deste não era só critica; era desesperada. O seo antagonista ali estava armado de seo incontestavel direito para humilhal-o, esmagal-o, e o que mais é, despedaçar-lhe a alma, roubando-lhe a amante adorada, o idolo de seo coração, que ia-lhe ser arrancada dos braços para ser prostituida ao amor brutal de um senhor devasso, senão sacrificada ao seo furor. Não tinha remedio senão curvar-se sem murmurar, ao golpe do destino, e ver de braços cruzados mettida em ferros, e entregue ao azorrague do algôz a nobre e angelica creatura, que unica entre tantas bellezas, lhe fizera palpitar o coração em emoções do mais extremoso e puro amor.

Deploravel contingencia, a que somos arrastados em consequencia de uma instituição absurda e deshumana!

O devasso, o libertino, o algôz, apresenta-se altivo e arrogante, tendo a seo favor a lei e a autoridade, o direito e a força, lança a garra sobre a presa, que é objecto de sua cobiça ou de seo odio, e pode fruil-a ou esmagal-a a seo talante, emquanto o homem de nobre coração, de impulsos generosos, inerme perante a lei, ahi fica supplantado, tolhido, manietado sem poder estender o braço em soccorro da innocente e nobre victima, que deseja proteger. Assim, por uma estranha aberração, vemos a lei armando o vicio, e decepando os braços á virtude.